publicado em 16 de outubro de 2013 às 14:00
NO DIA DOS PROFESSORES RECEBEMOS O CINISMO DO GOVERNADOR COMO HOMENAGEM
sugerido pelo Ítalo Agra, no Facebook
Em algumas situações, calar é um atentado à história, essa é uma delas. Os professores de Pernambuco vêm sendo pisoteados por um governo autoritário e avesso às demandas históricas da qualificação da escola pública e valorização dos trabalhadores da educação.
Ao final do segundo mandato, o governador (e presidenciável) Eduardo Campos, vem a público, em renomado meio de comunicação TENTAR reescrever a história do seu governo em relação à educação pública e aos trabalhadores da educação.
Portanto, nós do Movimento Professor de Pernambuco e da Alternativa SINTEPE assumimos o dever de nos contrapor a cada ponto da entrevista do governador, apresentando uma série de elementos que atestam o quanto o discurso se afasta da materialidade dos fatos.
ÉPOCA – O senhor falou em educação. Pernambuco criou um sistema que paga bônus a professores que cumprem metas. No Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes enfrenta uma greve, entre outras coisas, porque quer implantar algo parecido. Na Presidência, o senhor faria um programa de meritocracia semelhante?
Campos – “Não é só colocar remuneração variável. É preciso haver valorização do professor, com plano de cargos, carreiras e vencimentos. Que diferencie quem faz especialização, que prestigie quem faz mestrado e doutorado”
O nosso PCC (plano de cargos e carreiras) foi achatado para cumprir a lei do piso com um malabarismo contábil.
Conforme o PCC, nossa graduação vale apenas R$ 78,39, a especialização R$ 213,98, mestrado R$ 260,40, e doutorado R$ 318,07 a mais no Piso Nacional dos Professores. Qual o prestígio?
Isso sem falar na absurda dificuldade que passamos até que o afastamento venha ser liberado e, pior ainda, para prorrogar o prazo.
Além disso, foi baixado um decreto por vossa senhoria, que não reconhece o período de elaboração da dissertação como passivo de afastamento integral. O que é um absurdo, e um desestímulo a todo servidor que se “atrever” a ingressar na pós-graduação.
Dessa forma, ninguém na rede estadual se sente motivado a cursar mestrado ou doutorado, pretendendo ficar na rede, pelo contrário; os que fazem ficam até pagar o tempo que ficam devendo e saem assim que podem.
Ao contrário do que ocorre em municípios como Ipojuca, na região metropolitana do Recife, que paga muito mais aos professores e dispõe de estímulos para que os que têm mais qualificação acadêmica não saiam da educação básica.
Campos – “que possa abrir a possibilidade de o professor fazer reciclagem e capacitação continuada”.
Primeiramente, é bom ressaltar que gente não se recicla. O que deveríamos ter era um suporte pedagógico estruturado nas escolas e gerências.
Pelo contrário, faltam educadores de apoio na maioria das escolas, e as formações, quando acontecem, raramente dialogam com a necessidade real das escolas e focam geralmente na produção de resultados.
Defendemos que os resultados não representam necessariamente a qualidade da escola, e sim apenas um indicador da mesma. E que os resultados devem ser a decorrência do funcionamento do currículo e do processo de ensino-aprendizagem, e não da conversão do currículo à lógica dos cursinhos e simulados.
Isso para nós significa burlar o processo, é uma fraude velada, revestida de verniz pedagógico.
Campos – “Não posso substituir salário pela remuneração variável. Seria uma agressão ao bom senso e ao professorado. É preciso haver salário e carreira para que o professor possa crescer. E ele tem de ter o bônus”.
Em termos de agressão ao bom senso e a categoria o Exmo. é um perito, mas poderia ser menos incoerente com os fatos e assumir a sua verdadeira posição nessa resposta.
Segundo o Prof. Luiz Carlos Freitas, a remuneração variável é um experimento social, pois não há larga comprovação empírica da sua eficiência na educação.
A escola não é uma linha de produção, não podemos responder diretamente pelo resultado do aluno, pois há diversos fatores que interferem no resultado, sobretudo as condições socioeconômicas dos alunos, o nível de interesse e mesmo a estrutura que está disponível na escola.
Essa política provocou o apostilamento do currículo e a corrupção dos processos avaliativos nos lugares onde foi implementada, especialmente nos Estados Unidos, como atestou Diane Ravitch.
Além disso, Pernambuco paga um dos piores salários do Brasil, e a nossa carreira foi pilhada e carcomida pela sua Gestão.
Compreendemos o bônus como uma chantagem para a “fabricação” de resultados, isso não é valorização da categoria.
Tanto que as avaliações demonstram o fracasso retumbante dessa política, mesmo no ensino médio, incluindo as tão divulgadas escolas de referência.
O Sr. Governador tem que lembrar que sua função não é a de criar ilhas de excelência, sua obrigação é qualificar a educação para todos, e contar com a avaliação da rede como um todo.
As escalas de proficiência demonstram o fracasso da política gerencialista associada à desvalorização da categoria e na supressão de direitos.
É por isso que a sua propaganda tem se concentrado em “perfumarias” como a distribuição de tablets, o envio de alunos para intercâmbio no exterior; inclusive o próprio portal do SAEPE [Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco] não está disponibilizando todas as escalas de proficiência de 2012. Por acaso o governo só publica os dados quando são vantajosos aos seus propósitos?
ÉPOCA – O professor ganha mal no Brasil?
Campos – Ganha mal. Acumulou-se a gestão malfeita no passado, e muitos lugares ficaram condenados a remunerar mal.
Não há uma fatalidade, nem uma lei da natureza. A má remuneração, que é só um elemento da esfacelada carreira docente, é uma CONSTRUÇÃO POLÍTICA, e como tal pode ser desfeita, assim como é tão natural que os políticos, aumentem os seus próprios salários ou o de sua categoria de origem para ter benefício próprio.
Como foi aumentado o seu próprio salário, no mesmo período em que achatou o nosso PCC.
Campos — Se houver diálogo com os professores, e se houver disposição, construiremos uma travessia de resgate de autoestima, fundamental para o resultado no aprendizado.
Diálogo com os professores? Quando foi isso?
Em Pernambuco os professores só são chamados para legitimar o que está feito e sair na foto para a propaganda.
Não tem como haver diálogo com quem alardeia a riqueza auferida pelo crescimento do Estado e ao mesmo tempo se nega a discutir qualquer mísera melhoria para a categoria.
Se o Sr. fosse generoso com os trabalhadores da educação como foi com a licitação dos tablets, os professores de Pernambuco teriam pouco a reclamar.
Campos – “Se o professorado ficar deprimido, não haverá resultado.”
O que deprime o professor é a falta de dignidade dos agentes públicos, que além de não valorizarem os profissionais da educação ainda se mobilizam para derrubar ou sabotar as leis que apresentam melhorias, como foi e está sendo com a lei do piso e o novo PNE.
O que deprime os professores é falta de sensibilidade e o extremo rigor do Sr. Governador em ignorar solenemente a categoria, concedendo uma entrevista para o país inteiro falando de um PCC que foi pilhado por sua gestão, de um diálogo que o senhor nunca teve, ou de um repeito que nunca nos foi facultado.
Toda sua política é baseada na produção de indicadores, via pressão, fiscalização, perseguição e supressão de direitos.
Aqui vale o adestramento, bônus para quem atingir a meta (não importa como) e a represália e o escárnio público para quem não atingiu (não importa por que).
Somos tratados como os cachorros de Pavlov, pois você não trata “gente como gente”, e sim como instrumentos adestráveis para produção de capital eleitoral, ou seja, indicadores favoráveis à sua “tara presidencial”.
Muitos colegas tem motivo para ficarem deprimidos diante da sanha absurda de fechar escolas e jogar sua responsabilidade com o ensino fundamental para os municípios, mediante um acordo de compadres com os prefeitos de municípios que, na grande maioria, tem como fonte maior de receitas o FPM [Fundo de Participação dos Municípios].
E pior, sem provar à sociedade que essa responsabilidade assumida pelos municípios irá comprometer a Lei de Responsabilidade Fiscal, ou que trará benefícios à educação.
Onde está sua visão de longo prazo? Onde está o gestor moderno? O novo na política? Não seria a municipalização uma estratégia para fabricar estatísticas positivas para exibir no pleito de 2014?
Por exemplo, que Pernambuco tem tantos por cento de alunos matriculados no ensino integral e semi-integral?
De fato, é bem mais fácil jogar alunos para o município do que criar realmente boas escolas e produzir esses indicadores.
Ou seja, vemos uma absurda vontade de fabricar um pioneirismo que não passa da repetição das formas mercadológicas já aplicadas em Minas, São Paulo e Rio de Janeiro, mas com um verniz socialista (e bota verniz nisso)
E já que o Sr. falou em depressão, o que não faltam são colegas doentes pela pressão e a desvalorização com que são tratados. Atitude que agora também parte dos alunos, em casos de violência verbal e física que são cada vez mais recorrentes.
Além disso, quem estiver depressivo ou com qualquer outra doença está difícil para se tratar devido à precariedade do SASSEPE [Sistema de Assistência à Saúde dos Servidores do Estado de Pernambuco], e que está para piorar já que o Sr. “benfeitor” da educação, acha pouco que 70% dos custos do plano são assumidos pelos servidores públicos.
E além do governo não cumprir bem o seu papel, vem com uma proposta absurda para “salvar” o plano, que implica em aumento de até 160% no valor das contribuições, mesmo considerando que quem tem dois vínculos contribui duas vezes, e que o ônus maior tem sido do servidor.
Não me admira que o serviço seja terceirizado quando quebrar de vez, já que privatizar serviços virou moda em Pernambuco, vide o sistema de saúde.
Os donos das empresas devem adorar e serem muito gratos por suas privatizações.
Em contrapartida, os trabalhadores da educação não tem muito o que comemorar, tem motivos para estarem “deprimidos” com a sua gestão, que tem sido extremamente cruel com os professores.
A suposta revolução na educação de Pernambuco é uma peça de publicidade, um simulacro.
O seu Programa de Modernização da Gestão Pública fracassou em seus objetivos para educação, o Pacto pela Educação parece estar em fase de testes, o SIEPE é um sistema instável e que tem sido utilizado mais como um instrumento coerção e exploração dos docentes do que em suas qualidades para a gestão.
Mesmo com todos os reforços para produzir resultados (vide o aprender mais, um programa limitado a treinar os alunos para a prova do SAEPE), as escalas de proficiência da rede demonstram o fracasso de tentar transformar a escola em uma linha de produção, ignorando as absurdas desigualdades existentes dentro da rede, inclusive amplamente promovidas pelo SEU governo, que elege escolas para serem de referência duvidável e outras para serem de excrescência contínua.
O legado do seu governo para educação foi o de tentar produzir uma maquiagem modernizadora, uma reforma da aparência, da estrutura, do alimento, ao mesmo tempo que culpabiliza os professores, priorizando a chantagem da meritocracia à uma política real de valorização por desempenho, conforme consta no PCC e nunca foi regulamentado.
O legado do seu governo foi o da educação como fabricação de capital eleitoral a partir de resultados e programas vitrine, para obter voto, intercâmbio no exterior, quando a grande maioria não tem aulas de inglês adequadas, quando não se preocupa em garantir professores ensinando disciplinas da sua área de formação.
Distribui tablets para os alunos (com preços bastante generosos), enquanto a maioria das escolas tem bibliotecas que não funcionam, inclusive por falta de funcionário — e da mesma forma são os laboratórios.
A escola que tem um tablet por aluno, mas que tem livros (inclusive novos) mofando por desuso, também não possui internet wi fi, e quando tem, não suporta a demanda.
E o pior, os professores que deveriam saber utilizar essa tecnologia, além de não receberem o equipamento, não receberam nenhuma formação de como utilizá-lo para potencializar o trabalho didático.
A escola que distribui tablets e manda alunos para o exterior, ainda enfrenta falta de professores, de porteiros, de educadores de apoio.
Aliás, a estrutura pedagógica das escolas é pífia, já o controle “burrocrático” é absurdo, resultando inclusive na cobrança do preenchimento das cadernetas (faltas, notas e registros de aula), do SIEPE (faltas diárias), e do Sistema de Monitoramento de Conteúdo para os professores de Língua portuguesa e matemática, implicando numa excelência na burocracia, associada à indigência da pedagogia.
Por esses e outros motivos sua entrevista é uma demonstração de completo cinismo com relação aos professores, que fique certo não ficarão calados sempre que suas falácias forem difundidas para o Brasil como se fossem o milagre da educação em Pernambuco.
O tal milagre, assim como sua imagem política vendida para o país, constituem uma obra de ficção, um embuste para inglês ver.
Queremos ressaltar que nossa queixa não é só salário, que nossa queixa não se reduz à pauta corporativa.
Muito mais que isso, vemos que Pernambuco vive um momento bastante favorável à quitação da dívida histórica que tem com a grande maioria da sua população, em termos de serviços públicos de qualidade.
No tocante à educação, defendemos uma escola pública de qualidade social e realmente para todos, e não a produção de ilhas de excelência para servir de vitrine política, enquanto os de sempre são tratados como excrescência.
Não aceitamos uma responsabilização que não trata de cobrar as responsabilidades de cada agente implementador, na prática se limita à culpabilização dos trabalhadores da educação, especialmente os professores, por problemas que são sistêmicos e responsabilidades que são coletivas.
Não aceitamos a desfaçatez com que o governo ignorou solenemente as pautas históricas da promoção da escola pública com efetiva qualidade social, e não apenas, restrita à uma medida limitada de fluxo e proficiência, como se estas condensassem toda a complexidade inerente ao fazer educativo.
Ressaltamos que nosso grupo não tem “filiação partidária”, o nosso partido é a educação pública. Não temos interesse eleitoral, nem tampouco a pretensão de negar os avanços obtidos nesse período; no entanto, não silenciaremos ante o cinismo.
Cansamos de ser sub-representados e desrespeitados como categoria.
Por fim, convidamos o senhor e o secretário a praticarem efetivamente o discurso feito na entrevista concedida. E também a irem às escolas com os fatídicos “piores resultados” e constatarem o quanto de responsabilidade do governo subjaz o mero indicador.
Convidamos, sobretudo, a todo brasileiro, mídia e outros meios de comunicação, que realmente estejam interessados em conhecer a famigerada modernização da gestão em Pernambuco, para além da vitrine governista.
Dispomos-nos a esclarecer a quem desejar os argumentos que apresentamos como lacunas da política educacional vigente na rede estadual e suas brutais consequências para a garantia do direito à educação.
Ficaremos atentos às próximas falácias, e faremos questão de apresentar ao povo brasileiro a face real da sua política educacional.
SUBSCREVEM ESSA NOTA DE REPÚDIO
MOVIMENTO PROFESSOR DE PERNAMBUCO
GRUPO PROFESSOR DE PERNAMBUCO
ALTERNATIVA SINTEPE
Recife-PE, 15 DE OUTUBRO DE 2013
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