Assim que se elegeu governador do Estado de Pernambuco, o hoje candidato à Presidência da República, Eduardo Campos, buscou apoio na academia. O Pacto pela Vida, apresentado como uma das principais vitrines do seu Governo, é um exemplo disso.Aos poucos, por diversas razões, essa lua-de-mel foi se exaurindo, até a consolidação de um hiato profundo. Hoje, encontra-se na UFPE um dos principais focos de oposição ao ex-governador, inclusive no centro onde ele estudou quando mais jovem. Não raro, a arrogância cega os governantes. A soberba se encarrega de completar o serviço. Um pouco de humildade faria muito bem aos nossos gestores. Os problemas do Pacto pela Vida, por exemplo, quase todos os dias, estão sendo postos pelos acadêmicos. Agora ficamos sabendo que o Governo do Estado estaria contratando uma empresa para realizar um amplo levantamento sobre as causas dos saques e vandalismos que ocorreram na cidade de Abreu e Lima há duas semanas atrás. O objetivo seria o de evitar ou prevenir possíveis ocorrências similares. Ficamos bastante preocupados com os vieses dessas intervenções. Outro dia, o Estado fez questão de alardear que iria "punir com rigor" os envolvidos naqueles episódios.É impressionante como tudo se encaixa naquela diretriz de proteção do capital, ou seja, em nenhum momento observa-se uma preocupação do Estado em atender as legitimas demandas daquela população no que concerne às políticas públicas de saúde, educação, segurança cidadã, mobilidade, habitação, trabalho, renda etc. Desde de junho de 2013 que a população pede mudanças nessa agenda pública. Eles continuam fazendo ouvidos de moucos. Qualquer dias desses a porca torce o rabo novamente. É essa "seletividade" de ações de programas como o Pacto pela Vida - orientado para a defesa dos cidadãos-consumidores e incluídos socialmente, além do comércio - que estão levando à ruína esse Governo. O conceito de segurança pública deve contemplar as questões postas acima e não se limitar, unicamente, "punir" os transgressores, por vezes, com a morte. Há quem não curta muito a ideia de levar o sociólogo polonês Zygmunt Bauman para visitar Abreu e Lima, mas ele tem razão ao observar que esse apelo demasiado ao consumismo esgarça os laços comunitários, além de proporcionar enormes frustrações entre aqueles cidadãos induzidos/privados desse consumo. Posso assegurar que ele ficaria muito bem por aqui, saboreando as mangas Maranhão e comendo as castanhas de caju torradas com palhas de bananeiras do nosso sítio. Se chegar na invernada, ainda terá poderá experimentar as deliciosas bundas de tanajuras com farinha. Numa sociedade onde o que vale como critério de cidadania é o "ter" acesso ao consumo, aquelas hordas que não conseguem atingir esse objetivo - que também é um direito deles - certamente, terão que ser "contida" através de um Estado policialesco e repressor. Como essas contradições estão no DNA capitalista, faz sentido a observação do filósofo Slavoj Zizek, quando ele se refere à tendência de fortalecimento autoritário do exercício do poder político.Tanto aqui em Pernambuco como em outros Estados da Federação, as políticas de segurança pública estão sendo orientadas por alguns vieses profundamente equivocados, quase sempre pautadas pelo "endurecimento" das ações contras os mais vulneráveis, notadamente os contingentes populacionais mais empobrecidos, moradores das periferias, de cor negra. O que está em jogo é o novo conceito de "cidadão", ou seja, o cara que tem acesso aos bens de consumo capitalista, que desfila com seus carrões, moram em bairros nobres, almoçam em restaurantes chiques e compram suas guloseimas nas delicatessen nos finais de tarde. Quem não cumpre esse rito não merece o status de "cidadão". É more or less isso o que vem ocorrendo. Talvez seja o momento de rediscutir "valores" e "agenda pública". Os maiores "saqueadores" estão inseridos no aparelho de Estado, alguns sob o manto da impunidade, com uma ampla rede de proteção. Basta observar os dados mais recentes, informados pelo TCE, envolvendo prefeitos e servidores públicos "pegos" em maracutaias com o dinheiro de nossos impostos. Os rebelados, excluídos do consumo, acabaram devolvendo, em sua maioria, as mercadorias saqueadas nas lojas durante a greve da Polícia Militar. Qual o montante que esses políticos devolverão ao erário? Não vale o argumento de que uma situação poderia justificar a outra. Em certos aspectos, ambas estão equivocadas. Mas, o exemplo dos que nos governam, possivelmente, surtiria um efeito pedagógico enorme. Exemplo e sensibilidade para entender a origem do ovo da serpente, senhor governador. Vamos deixar de maquiagens. Política de segurança pública orientada quase que exclusivamente para defender o patrimônio e os cidadãos-consumidores? Isso não pode dar certo.
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