Não precisamos fazer um grande esforço para ser convencido pelos argumentos apresentados pelo cientista político Fernando Schüler acerca dos limites de nossa democracia no tocante à liberdade de expressão. Há, inclusive, questões polêmicas em torno do conceito - ou do entendimento sobre ele - por parte de alguns atores políticos ou agentes públicos. Faz algum tempo que o tema se tornou recorrente para o cientista político do INSPER, que vem apontando eventuais equívocos ou erros de interpretação deliberada de autoridades brasileira no que concerne a este assunto.
De fato ele tem razão quando afirma que o quadro ficou tão nebuloso que cada brasileiro passou a pensar duas vezes antes de externar publicamente a sua opinião. O editor deste blog, por exemplo, exerce uma espécie de auto-censura, ou seja, ponderamos bastante antes de publicar qualquer coisa, sobretudo nesses tempos bicudos que passamos a enfrentar no país. Escrever um editorial sobre as atrocidades cometidas por agentes públicos da força policial, por exemplo, pode assanhar a corporação a ficar contra você, quando, na realidade, você está prestando um serviço contra os maus policiais. Gestores públicos flagrados em malversação de recursos, normalmente, respondem às críticas com processos judiciais contra jornalistas e blogueiros. Defender a democracia e suas instituições, hoje, já seria motivo suficiente para atiçar a horda de grupos de orientação fascista, em número crescente no país, que logo passam a ameaçar os desafetos, na ausência de argumentos.
Esse fenômeno avança na mesma medida proporcional à deteriorização da nossa experiência democrática, fenômeno que já vem se observando há algum tempo, conforme atestam os organismos mundiais que mensuram a saúde dos regimes democráticos. No último deles, ostentamos a condição de a democracia mais ameaçada do mundo. A mentira tornou-se uma arma política, utilizada com os requintes de crueldade contra adversários, amparada por instrumentos tecnológicos cada vez mais sofisticados, disseminados através das redes sociais.
Fernando Schüler tem uma opinião sobre o que significa "liberdade de expressão" bastante divergente da opinião de algumas autoridades do Poder Judiciário brasileiro. No fundo, ele radicaliza na defesa do cidadão e da cidadã em externar a sua opinião, sem que isso se constitua num crime idelógico, abrindo espaço para severas punições, como o banimento das redes sociais, por exemplo. O cientista político é, na realidade, um intransigente defensor da democracia, do "verdadeiro jornalismo", já que ele é um grande admirador do escritor britânico,George Orwell, ou seja, dizer aquilo que "incomoda" a alguém. Tudo mais seria propaganda, de acordo com o autor de "1984".
Já faz algum tempo, por exemplo, que cidadãos e cidadãs estão sendo punidos pelo "domínio do fato", uma aberração que atropela os princípios basilares do direito, como a presunção de inocência, a constituição de provas irrefutáveis, o devido processo legal e o direito ao contraditório. Este também é um momento que se caracteriza pela insegurança ou "afrouxamento jurídico", ao nosso ver, exatamente para para dar suporte às tessituras de cunho não necessariamente democrático. Fernando Schüler tem bons argumentos para defender suas teses, como, por exemplo, ao apontar a contradição de algumas autoridades, que impediram o Poder Executivo de bisbilhotar a vida do cidadão comum, mas usam dos mesmos expedientes para punir quem desfere ataques corporativos aos membros do órgão que representam.
A expressão "crimedia" é uma referência ao livro "1984", do escritor inglês George Orwell. O artigo de Fernando Schüler está na edição da revista Veja desta semana.
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