Alguns analistas observam que as políticas neoliberais entraram na América Latina a partir do Chile, em 1973, com o golpe de Estado que derrubou o Governo Salvador Allende, de orientação socialista. Avaliação correta ou não, o fato concreto é que, a partir de então, autoritarismo e neoliberalismo passaram a estabelecer uma relação siamesa naquele país, onde até os recursos hídricos foram privatizados. Essa combinação - que, certamente, não causaria surpresa ao filósofo francês Michel Foucault - trouxe consequências trágicas para a população, que amargou uma das ditaduras mais sangrentas do continente e, mais recentemente, arrochos econômicos gigantestos, que levou a população a organizar vários protestos de rua, com repressão dura do aparelho de Estado.
Mesmo neste contexto político e econômico adverso, algumas conquistas foram obtidas neste período, como uma reação tenaz do povo chileno contra a ditadura e aos grupos de orientação neofascistas. O Chile conseguiu avanços significativos, por exemplo, em reconstituir a memória daquele período de trevas e obscurantismo da ditadura de Pinochet, através de instituições criadas com este propósito. Tornou-se emblemática a expulsão, ao vivo, de um programa de entrevistas transmitidos por uma TV,onde um dos participantes negou que houvesse ocorrida torturas físicas durante a ditadura.Doloroso ouvir esses nagacionistas, quando sabemos que o cantor Victor Jara teve suas mãos esmagadas a coronhadas e foi assassinado com 42 tiros, num requinte de crueldade cometido pelos asseclas da ditadura.
Esses comentários iniciais são para dar um panorama do quadro político daquele país, onde o candidato da esquerda, Gabriel Boric recentemente derrotou o ultradireitista José Antonio Kast, numa vitória bastante festejada pelas forças progressistas do continente. Há o que comemorar? Sim. Nada pior do que permitir que a ultradireita voltasse a governar aquele país, principalmente por suas simpatias com o Governo ditatorial de Augusto Pinochet e o flerte com grupos neofascistas, que se mobilizaram em torno de sua eleição. A grande questão, no entanto é o perfil do candidato eleito e capilarirade política e econômica que os grupos conservadores conquistaram naquele país,como de resto em toto o continente, inclusive no Brasil.
Amiúde, comenta-se que as empresas de transporte público reduziram a suas frotas naqueles bairros periféricos, onde o candidato Gabriel Boric teria um apoio maior da população, num claro boicote à sua candidatura. O governo Boric, portanto, sofrerá um assédio violento desses grupos e seus represetantes no parlamento. Fica como lição histórica o que ocorreu em 2016 aqui no Brasil, onde moinhos de ventos foram acionados para que a presidente Dilma Rousseff(PT-MG) não concluísse o seu mandato. Um torniquete político que culminou num golpe institucional. Uma outra referência histórica é o governo do também esquerdista, o professor Pedro Castillo, no Peru, que sofre um assédio violento dos grupos conservadores dentro e fora do parlamento.
Um outro fato digno de registro é que o candidato Gabriel Boriç não pode ser considerado um esquerdista raiz. Trata-se de alguém que fez carreira no movimento estudantil, nunca flertou com ideias marxistas, celebrou alianças com grupos conservadores e é omisso no tocante à prisão dos líderes que participaram dos ùltimos protestos naquele país. Melhor do que um ultradireitista? sim, mas a esquerda deve ir colocando as barbas de molho no tocante às expectativas sobre o seu governo.
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