JOSÉ LUIZ GOMES ESCREVE
A
notícia mais comentada pela crônica política, no momento, é o indeferimento,
pelo Tribunal Superior Eleitoral, do registro do partido Rede Sustentabilidade,
proposto por Marina Silva. Ao apagar das luzes do prazo final no que concerne à
legislação relativa aos partidos políticos, inclusive o troca-troca das
cadeiras, pode-se tirar algumas conclusões sobre o nosso frágil sistema
partidário, hoje orientado, quase que exclusivamente, pela lógica da “Lei de
Ferro da Competição Eleitoral”, como diria o cientista político Wanderley
Guilherme dos Santos, do IUPERJ.
A
“Lei de Ferro da Competição Eleitoral” foi inspirada, como admite o próprio
Wanderley, na “Lei de Ferro das Oligarquias”, do sociólogo alemão Robert
Michells, que prevê um final inexoravelmente oligárquico para as organizações
sindicais e partidárias. No caso específico da “Lei de Ferro da Competição
Eleitoral”, os constrangimentos impostos pela legislação e pela dinâmica da
competição eleitoral em cada quadra, acabam moldando o “perfil” dos grêmios partidários,
num círculo vicioso – em alguns casos, como o do Brasil - extremamente danoso
para a consolidação da democracia. Expressões do tipo “o eleitor não sabe votar”
são um indicativo dessa “inorganicidade” ou do hiato estabelecido entre
eleitores e partidos políticos no Brasil.
São
poucos os partidos de natureza programática ou orientado ideologicamente, uma
vez que o universo de eleitores com esse perfil de exigência é muito pouco no
contexto do universo de eleitores aptos a sufragarem este ou aquele partido
numa eleição. Partidos com esse perfil, importantíssimo na construção de um
sistema partidário orgânico e consolidado, acabam sendo “marginalizados” caso
não fechem alguns “acordos”. Ou seja, a
tendência é que esses partidos não se viabilizem no “mercado”, mesmo entrando
nas regras do jogo da democracia representativa, para alguns, exauridas.
Se
tomarmos como exemplo, dentro do sistema partidário brasileiro, o caso de
partidos como o PT e o PSTU, observa-se, nitidamente, o que estamos afirmando.
Ambos entraram no “sistema”, mas o PSTU continua defendendo teses radicais, com
um discurso marcado pela dicotomia e polarização entre trabalho e capital,
operário e burguês. Até as palavras de ordem são as mesmas usados pelo PT na
década de 80, traduzidas no “Vote no 03, o resto é burguês”. O que a dinâmica
da competição eleitoral não fizer, o tempo se encarregará de fazer, abrindo a
fila para outros radicais, girando a “bacia semântica” do antropólogo Gilbert
Durand.
Uma
pesquisa simples poderia indicar, por exemplo, quantos eleitores orientados
ideologicamente um partido como o PT perdeu ao longo de sua trajetória. Pelo menos
um podemos indicar: o sociólogo Francisco de Oliveira. Por outro lado, qual o
universo de eleitores “pragmáticos” que passaram a creditar seu voto na legenda,
motivados, em alguns casos, por interesses meramente corporativos, guinando o
partido ao poder?
A
célebre frase proferida por Lula, aos companheiros do ABC, ainda na década de
80, de que “Não importa a cor do voto desde que ele caia na urna”,
dimensiona bem o que estamos afirmando. Além de promover todos os arranjos
institucionais para entrar no jogo da democracia representativa burguesa, o PT
hoje vive um crescente processo de oligarquização, confirmando as duas “leis”
acima. Evidentemente, o “mercado eleitoral” não é um mercado qualquer. Em suas entrelinhas,
está a agenda de políticas públicas para a educação, saúde, mobilidade urbana,
papel do Estado etc. Neste aspecto, em razão de suas conseqüências, mereceria
um outro tratamento.
Infelizmente,
porém, não é dessa forma que ele vem sendo tratado nem pelos políticos e muito
menos pelos partidos políticos, daí a constatarmos uma evidente crise de
representatividade e, ou, a conseqüente falência desse sistema de
representação, como vem sendo advogado por teóricos como Manuel Castells, algo
também observado na agenda que surgiu das manifestações de rua que ocorreram no
Brasil recentemente.
A
Rede Sustentabilidade teve seu registro negado porque não cumpriu os requisitos
mínimos exigidos pela Legislação Eleitoral. Perdeu de 6 a 01 no TSE. Seus
integrantes ainda questionaram as possíveis mais 100 mil assinaturas recusadas
pelos Cartórios Eleitorais, onde havia até defunto assinando filiação à Rede.
Há varias especulações sobre qual seria o destino de Marina. Talvez se filie a
um pequeno partido, se deseja mesmo candidatar-se à Presidência da República em
2014.
Um
exame minucioso da Justiça Eleitoral sobre o cumprimento dos requisitos legais
das exigências, certamente, seria suficiente para “cassar” muitos desses
partidos aí existentes e não apenas a Rede Sustentabilidade. Possibilidade que
levaram alguns a perceberem na negação do registro partidário uma manobra para “apear”
Marina do jogo sucessório de 2014. Argumentos é o que não falta. Teorias
conspiratórias, então...
Não
há a menor dúvida que, no escopo do nosso sistema partidário, vamos encontrar
algumas aberrações. Bem piores do que as interdições legais enfrentadas pela
Rede de Marina Silva. As movimentações de velhas raposas nesses últimos dias
indicam claramente a fragilidade do galinheiro partidário. Algumas dessas
agremiações partidárias existem apenas para “acomodar” interesses escusos. Criadas
como um negócio de legendas de aluguel, tornaram-se capitanias hereditárias de
donatários, de olho no fundo partidário. Embalada nessa evidência que salta aos
olhos, nem mesmos os repórteres de política tomam algum cuidado ao se referirem
ao assunto, informando que o partido que era de “fulano” passou a ser de “beltrano”.
Isso com a maior naturalidade.
Neste
contexto, naturalmente, coerência e ideologia foram às favas. O jogo pesado
envolve não apenas as vantagens pessoais, mas apoio aos projetos de
reeleição e outras moedas do gênero. Os partidos, na maioria dos casos, apenas
trocaram de "donos". Trata-se
de uma decomposição ideológica sem tamanho, que atingiu até aqueles grêmios
partidários que ainda possuíam, mesmo que remotamente, pelo menos, algumas
referências históricas importantes, como os ditos “comunistas”. Aqui na
província, um Deputado Federal que já transitou por diversas agremiações,
entrou em suas fileiras, dizendo-se comunista desde criancinha.
Outro
Deputado, no passado um aguerrido líder petista que vimos surgir ainda no
Sindicato dos Policiais Civis do Estado, estaria se filiando ao PDT, que hoje
vem funcionando como uma espécie de “puxadinho” dos neo-socialistas do PSB. Ele
nega o fato, mas a sua presença, segundo dizem, no café da manhã com o
governador Eduardo Campos é uma evidência da célebre profecia de Paulo Guerra:
Em política não existem "nunca" nem "jamais". Nas eleições
passadas, em Paulista, nosso município, travou-se uma batalha campal entre este
Deputado e Júnior Matuto, o candidato do governador. Eduardo jogou pesado e
comprou a briga pessoalmente, indo ao município com o propósito de liquidar a
fatura. Ele, por sua vez, à época, tornou-se um crítico ferrenho do Governo
Eduardo Campos. Passada as eleições, tudo se "arranja".
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