Todas as pesquisas de intenções de voto para a Presidência da República
realizadas até o momento apontam uma folgada vantagem de Marina Silva
sobre Eduardo Campos, no contexto da aliança Rede/PSB. Até o momento,
Marina Silva é mais competitiva, podendo levar o pleito para um segundo
turno. Há quem afirme existir um acordo indicando que o pernambucano
será mesmo o cabeça de chapa, mas os pronunciamentos e os movimentos de
Marina Silva indicam o contrário. Raposas políticas da cozinha do
Planalto já andaram recomendando ao PT pernambucano segurar a lenha até
as coisas ficarem mais claras. Depois, o pau pode comer. O que não faltam
são motivos para divergências entre ambos. O mais recente foco de
indisposição é quadra paulistana, onde os socialistas praticamente já
fecharam um acordo com o governador Geraldo Alckmin, enquanto os
marineiros defendem a tese de uma candidatura própria. Em todo caso, o
governador Eduardo Campos continua se movimentando bastante. Aproveita
sua ida a São Paulo para gravar o Programa do Jô.
segunda-feira, 11 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: Cortaram o camarão de Renan Calheiros.
Há alguns bares na orla de Pajuçara que oferecem exelentes pratos à
base de camarão. Possivelmente será por lá que o presidente do Senado
Federal, Renan Calheiros, irá matar saudades do crustáceo. Não
é do seu perfil recuar diante das pressões populares, mas, por alguma
razão, foram cortados os 45 kilos de camarão qu estavam previstos na
lista inicial para a cozinha do Senado. A despensa daquela Casa custa ao
bolso do conttibuinte a exorbitante soma de R$ 7.100,00 mensais,
conforme já denunciamos pelo blog. O Painel de Folha informa que os
demais itens teriam sido mantidos, inclusive, as 60 latinhas de leite
condensados. Ainda na época da lua-de-mel entre o Palácio do Planalto e o
Palácio do Campo das Princesas, Lula e Dilma, como convidados de
Eduardo Campos, tiveram o prazer de experimentar um tradicional Camarão
na Moranga. Por essa época, costumávamos publicar algumas dicas de
culinária no blog. Há vários meses a postagem da receita de camarão na
moranga é líder de acessos.
Tijolaço: Escravo é o povo que vive ao abandono
10 de novembro de 2013 | 16:38
Quando, há muito anos, minha filha, então uma pré-adolescente,
fez um comentário preconceituoso e cruel sobre uma pobre mulher que
vivia em necessidades, próximo ao lugar onde morávamos, mandei-a buscar
um dicionário.
Revoltada, foi, resmungando muito. Então, mandei que lesse em voz alta o significado de compaixão.
-Eu sei, é pena…
-Leia, minha filha…
E então ela leu que compaixão é algo como ser capaz de sentir o
sofrimento alheio e ter o impulso de, mesmo não sendo o nosso,
mitigá-lo.
Lembrei-me disso lendo a matéria “No agreste, pacientes agradecem médicos cubanos de joelhos“, hoje, um trabalho sensível do repórter Daniel Carvalho, no interior de Pernambuco.
Leia um trecho e, se puder, leia a matéria inteira.
“A demanda de médicos no interior do país é gigantesca e a cubana
Teresa Rosales, 47, se surpreendeu com a recepção de seus pacientes em
Brejo da Madre de Deus, no agreste pernambucano.
“Eles [pacientes] ficam de joelhos no chão, agradecendo a Deus.
Dão beijos”, afirma a médica, que atendeu 231 pessoas neste primeiro mês
de trabalho dos profissionais que vieram para o Brasil pelo programa
Mais Médicos, do governo federal.
O posto de saúde em que Teresa trabalha fica no distrito de São Domingos, região pobre e castigada pela seca.
Durante os últimos quatro anos, o posto não tinha o básico:
médicos. Até o final de setembro, quando Teresa chegou ao distrito, quem
andava quilômetros de estrada de barro até chegar à unidade de saúde
sempre voltava para casa sem atendimento.
A situação se repetia a algumas ruas de lá, no posto onde o
marido de Teresa, Alberto Vicente, 43, começou a trabalhar em outubro.“Foi
Deus quem mandou esse homem. Era uma dificuldade, chegou a fechar o
posto por falta de médico”, disse a aposentada Isabel Rocha, 80, que
agora controla o diabetes sob orientação médica.
Ao ler isso,
pensei naquelas jovens de jaleco branco, vaiando os médicos cubanos no
Aeroporto de Fortaleza, aos gritos de “escravos, escravos”…
Talvez, já a caminho dos 30, não sejam capazes de entender o que eu
quis ensinar a uma mocinha de doze anos, mandando-a ler o dicionário…
Não, não há “torcida” política, partidária ou ideológica que possa
fazer imaginar ser bom um ser humano, por qualquer razão, ajoelhar-se
aos pés de outro ser humano.
Isso, sim, é viver na condição humilhante de escravo e na pior de
suas escalas, quando nem mais o chicote é preciso para fazer alguém se
ajoelhar.
Há outro látego vergastando estes nossos irmãos há séculos: o da
pobreza, o do abandono, o da indiferença dos dirigentes e das elites
deste país para com eles.
E essa indiferença veio à tona da maneira mais crua e chocante na reação ao “Mais Médicos”.
O “Mais Médicos” não vai, é certo, resolver todos os problemas da
saúde no Brasil. Como um prato de comida não vai resolver os problemas
da fome.
Mas é monstruoso, desumano, dá vontade de chorar ver que há gente que
quer lhes negar isso, esse mínimo, gente incapaz de sentir a parca
compaixão de cuidar de um semelhante em apuros.
Perdoem-me os médicos cubanos ou os outros estrangeiros, cuja maioria
até sei que tem tal capacidade, mas eu não estou nem um pouco
interessado em se vocês são capazes de um diagnóstico de alta
complexidade.
Talvez um entre dez mil destes brasileiros totalmente desvalidos
possa precisar de um. Outros 9.999, porém, vão morrer de diarréia,
verminose, infecções, doenças parasitárias ou de pneumonia e não daqui a
50 anos por complicações de uma formação quadricúspide de valva
aórtica, como foi detectado em outro filho tão amado quanto aquela.
Veio-me a cabeça o que me disse um bom amigo, médico, que trabalhava
no Hospital São Sebastião, de doenças infecto-parasitárias, no início da
epidemia da Aids: “Fernando, muitas vezes o que se pode fazer por essas
pessoas é dar-lhe uma cama limpa e lhes dar alguma atenção para
morrer”. Havia pouco, muito pouco a fazer, então, até que tivéssemos o
arsenal bendito, hoje, para cuidá-las.
Não, não pode trazer qualquer alegria ver nossos irmãos ajoelhados
porque houve alguém vindo de longe que não lhes foi indiferente, alguém
que talvez não vá a congressos médicos ou que não se feche em sua
condição de “culto e rico”, porque fez uma faculdade de Medicina, muitas
vezes paga com o dinheiro deste mesmo povo.
Nem que, por falta de atendimento primário, tudo se agrave e lote as
estruturas das cidades maiores, para onde os mais afortunados são
levados, quando aquilo que poderia ter sido curado muito antes, com
simplicidade, tenha uma gravidade muito maior.
As mocinhas de Fortaleza, ali tão perto de lugares de miséria, de
pobreza extrema, não são obrigadas a serem médicas. Mas, se são, não
estão desobrigadas de cuidar das pessoas. E o fato triste é que não
houve senão uma mínima procura para postos de trabalho com remuneração
digna (R$ 10 mil), suporte de casa e alimentação e um prazo razoável
para viver outra vida: três anos.
Nem mesmo para a periferia das grandes metrópoles houve interessados. Nem mesmo os mais jovens.
Com todo o respeito e acatamento pelas boas razões de quem diz que
saúde não é só médico, não há o que justifique isso por parte de boa
parte de uma corporação profissional.
Exceto, infelizmente, a perda de um sentimento de utilidade social que essa profissão, mais do que muitas, deve conter.
Ou de alguém que, na primeira aula, lesse para os calouros o verbete compaixão num dicionário.
Por: Fernando Brito, no Tijolaço
Tijolaço: As duas mortes de Jango. E seus assassinos, com armas e mídias.
11 de novembro de 2013 | 11:20
Saul Leblon publica hoje, na Carta Maior,
na semana em que se exuma o corpo de João Goulart atrás de sinais da
conspiração que pode tê-lo matado por envenenamento, um impecável texto
sobre a outra conspiração que causou a morte – a política – do
ex-presidente.
Morte pela mentira e pela difamação, crime continuado que prosseguiu por décadas e, de alguma forma, ainda prossegue hoje.
Antigas suspeitas em torno do seu desaparecimento devem ser esclarecidas agora com o exame que o regime militar que o derrubou nunca permitiu (leia a reportagem de Dario Pignotti; nesta pág)
A ditadura só autorizou o sepultamento do ex-presidente, em São Borja, em túmulo a 40 metros do de Getúlio Vargas, com féretro blindado.
Mesmo assim, na última hora, o então ministro do Exército, Sylvio Frota, da extrema direita militar, tentou anular a autorização expedida pela cúpula do governo Geisel.
Era tarde. Morto, Jango retornava ao Brasil 13 anos depois de expulso pelas baionetas e pelas manchetes do jornalismo conservador.
O caixão lacrado, conduzido em carro a alta velocidade, cruzaria a fronteira de Uruguaiana a 120 km por hora, vindo de Mercedes, na Argentina, onde ficava a estância dos Goulart.
Ladeava-o um aparato militar com ordens expressas de não permitir manifestações populares no trajeto.
Inútil.
Quando chegou a São Borja, a população em peso nas ruas cercou o cortejo; o caixão foi conduzido à catedral, de onde cruzaria a cidade em marcha solene até o cemitério.
‘Jango, Jango, Jango!’
Gritos guardados no fundo do peito desafiaram a presença das tropas e o aviltamento da memória do ex-presidente, alimentado pela mídia antes, durante e depois de 1964.
Independente do resultado da autópsia, a verdade é que Jango já havia sido assassinado uma primeira vez 12 anos e oito meses antes dessa cena.
A autópsia política das agenda dos anos 60 foi meticulosamente falsificada pela mídia que ajudou a derrubá-lo.
Está em jogo, portanto, mais que o desagravo a um brasileiro. E isso não deveria ser omitido no discurso oficial da homenagem solene que, com justiça, o governo deve render-lhe nesta 5ª feira, em Brasília.
Desqualificada pela caneta dos vencedores, a agenda do período pede exumação serena e afirmativa.
Contra isso atuou por décadas o monopólio das comunicações, hoje mais forte do que aquele existente há 49 anos, quando a ditadura impôs silêncio sobre o ciclo Jango.
Escribas da confiança do regime, que fariam carreira como confidentes de seus ‘bruxos –dos quais herdariam fuxicos e versões palacianas de densidade fascicular– cuidaram e cuidam de amesquinhar esse capítulo da luta pelo desenvolvimento brasileiro.
Nada mais sério que um mal passo de um país sob a presidência de um político hesitante e mulherengo.
Esse, o epitáfio dos vencedores a Jango e à geração de brasileiros que lutava por um país soberano e justo nos idos de 60.
Importa-lhes, sobretudo, rebaixar o debate em torno daquilo que interliga passado ao presente do país: a agenda e as instituições de ontem e de hoje.
A mídia, enquanto instituição, foi – é – parte interessada no assalto ao poder que interrompeu um governo democrático, suspendeu as liberdades e garantias individuais, sufocou o debate de reformas estruturais, prendeu, matou, torturou.
Foi conivente com a censura à própria liberdade de expressão.
Foi dela a iniciativa de convocar o medo e a mentira e alimentar o linchamento de reputações.
Agiu, não se sabe ainda com que grau de intimidade, mas é notória a sintonia com que atuou em relação ao Departamento de Estado norte-americano que -disso não resta mais dúvida– coordenava a desestabilização do governo Goulart.
Ontem como hoje, o conjunto foi decisivo para levar a classe média a incorporar um discernimento moralista e golpista à sua visão do processo brasileiro.
E mesmo assim, apenas uma parte dela.
O acervo do Ibope, catalogado pelo Arquivo Edgard Leuenroth, da Unicamp, reúne pesquisas de opinião pública feitas às vésperas do golpe.
Os dados cuidadosamente ocultados naqueles dias assumem incontornável atualidade cotejados com a atuação do aparato midiático nas horas que correm.
Enquetes levadas às ruas entre os dias 20 e 30 de março de 1964, quando a democracia já era tangida ao matadouro pelos que bradavam em sua defesa, mostram que:
a) 69% dos entrevistados avaliavam o governo Jango como ótimo (15%), bom (30%) e regular (24%).
b) Apenas 15% o consideravam ruim ou péssimo, fazendo eco dos jornais.
c) 49,8% cogitavam votar em Jango, caso ele se candidatasse à reeleição, em 1965 (seu mandato expirava em janeiro de 1966); 41,8% rejeitavam essa opção.
d) 59% apoiavam as medidas anunciadas pelo Presidente na famosa sexta-feira, 13 de março (em um comício que reuniu 150 mil pessoas na Central do Brasil –o país tinha então 72 milhões de habitantes, Jango assinaria decretos que expropriavam as terras às margens das rodovias para fins de reforma agrária, bem como nacionalizavam refinarias de petróleo).
As pesquisas sigilosas do Ibope formam o contrapelo estatístico de um jornalismo que ocultou elementos da equação política, convocou, exortou, manipulou, incentivou e apoiou a derrubada violenta do Presidente da República, em 31 de março de 1964.
Em editorial escrito com a tintura do cinismo oportunista, um dos centuriões daquelas jornadas, o diário O Globo, fez recentemente a autocrítica esperta de sua participação no episódio. Escusa-se no pontual, lamenta o apoio explícito, mas justifica a violência institucional, como inevitável diante do quadro caótico e extremado vivido então.
Se havia extremismo em bolsões à esquerda, o fato é que a incerteza social e a rejeição ao governo, como se vê pela pesquisa do Ibope, foram exacerbadas deliberadamente pelo aparato midiático para interditar o debate, desmoralizar lideranças, criminalizar bandeiras e vetar as soluções para os desafios do desenvolvimento.
Graus de semelhança com a engrenagem em movimento no país avultam aos olhos menos distraídos.
E esse é o ponto a reter, que faz da exumação dos restos mortais de Jango uma janela importante para enxergar não apenas o passado.
Em que medida a reordenação de um ciclo de desenvolvimento pode ocorrer dentro da democracia quando esta lhe sonega os meios para o debate e a construção das maiorias e do consentimento requeridos ao passo seguinte da história?
O Brasil dos anos 60 vivia, como agora, o esgotamento de um ciclo e o difícil parto do seguinte.
As reformas de base – a agrária, a urbana, a tributária, a política, a educacional — visavam destravar potencialidades e recursos de um sistema exaurido.
O impulso industrializante de Vargas, dos anos 30 a meados dos anos 50, e o do consumo , fomentado por Juscelino, mostravam claros sinais de esgotamento.
Trincas marmorizavam todo tecido social e produtivo.
À vulnerabilidade externa decorrente da frágil capacidade exportadora, adicionava-se um elemento de gravidade inexistente hoje: a seca do crédito internacional, aplaudida pelos que alardeavam a inconsistência macroeconômica do país, a exemplo dos que agora clamam pelo rebaixamento da nota do Brasil junto às agências de risco.
O déficit público pulsava o desequilíbrio entre as urgências do desenvolvimento e as disponibilidades para financiá-lo.
O PIB anêmico e a inflação de 25% no trimestre pré-golpe completavam a encruzilhada de uma sociedade a requerer um aggiornamento estrutural.
O conjunto tinha como arremate a guerra fria, exacerbada na América Latina pela vitória da revolução cubana, que desde 1959 irradiava uma agenda alternativa à luta pelo desenvolvimento.
O efeito na vida cotidiana era enervante. Como o seria no Chile, nove anos depois; como o é hoje, em certa medida, na Venezuela de Maduro; ou na Argentina de Cristina.
O mercado negro de produtos essenciais testava a paciência dos consumidores.
Óleo, trigo, açúcar, carne faltavam ciclicamente nos grandes centros urbanos.
Fruto, em parte, de uma escassez provocada pela sabotagem empresarial.
As reformas progressistas propostas por Jango estavam longe de caracterizar o alvorecer comunista alardeado diariamente nas manchetes do udenismo midiático.
O que se buscava era superar entraves –e privilégios– de uma máquina econômica entrevada em suas próprias contradições.
Jango pretendia associar a isso um salto de cidadania e justiça social, ampliando o acesso à educação e aos direitos no campo para dar um novo estirão no mercado interno.
Diante do salto ensaiado, e convocada a democracia a discutir o passo seguinte da história brasileira, os centuriões da legalidade optaram pelo golpe.
Deram ao escrutínio popular um atestado de incapacidade para formar os grandes consensos indispensáveis à estabilidade e duração de um ciclo de desenvolvimento.
Jango foi assassinado aí, pela primeira vez.
De forma violenta e em praça pública.
Se o fizeram de novo em dezembro de 1976, cabe agora averiguar de uma vez por todas.
Independente desse segundo diagnóstico, o tema das relações entre mídia e ditadura, mídia e desenvolvimento não pode mais se restringir aos bastidores das comissões da verdade.
Ecoa dos idos de 60 uma lição negligenciada por aqueles que ainda encaram o binômio ‘mídia e regulação’ como barganha de indulgência, junto a um poder que, em última instância, deseja-lhes a mesma sorte de Jango.
Não há revanchismo nessa constatação.
Pauta-a a necessidade de dotar a democracia das salvaguardas de memória, pluralidade e participação social, que a preservem de uma recaída da intolerância, como a de 1964, que subtraiu à sociedade a prerrogativa de decidir o seu próprio destino
Morte pela mentira e pela difamação, crime continuado que prosseguiu por décadas e, de alguma forma, ainda prossegue hoje.
Jango: mídia falsificou a autópsia política
Saul Leblon
Trinta e
sete anos após ter sido atribuída a um ataque cardíaco, a morte do
ex-presidente João Goulart, ocorrida no exílio, em 6 de dezembro de
1976, volta ao noticiário.Antigas suspeitas em torno do seu desaparecimento devem ser esclarecidas agora com o exame que o regime militar que o derrubou nunca permitiu (leia a reportagem de Dario Pignotti; nesta pág)
A ditadura só autorizou o sepultamento do ex-presidente, em São Borja, em túmulo a 40 metros do de Getúlio Vargas, com féretro blindado.
Mesmo assim, na última hora, o então ministro do Exército, Sylvio Frota, da extrema direita militar, tentou anular a autorização expedida pela cúpula do governo Geisel.
Era tarde. Morto, Jango retornava ao Brasil 13 anos depois de expulso pelas baionetas e pelas manchetes do jornalismo conservador.
O caixão lacrado, conduzido em carro a alta velocidade, cruzaria a fronteira de Uruguaiana a 120 km por hora, vindo de Mercedes, na Argentina, onde ficava a estância dos Goulart.
Ladeava-o um aparato militar com ordens expressas de não permitir manifestações populares no trajeto.
Inútil.
Quando chegou a São Borja, a população em peso nas ruas cercou o cortejo; o caixão foi conduzido à catedral, de onde cruzaria a cidade em marcha solene até o cemitério.
‘Jango, Jango, Jango!’
Gritos guardados no fundo do peito desafiaram a presença das tropas e o aviltamento da memória do ex-presidente, alimentado pela mídia antes, durante e depois de 1964.
Independente do resultado da autópsia, a verdade é que Jango já havia sido assassinado uma primeira vez 12 anos e oito meses antes dessa cena.
A autópsia política das agenda dos anos 60 foi meticulosamente falsificada pela mídia que ajudou a derrubá-lo.
Está em jogo, portanto, mais que o desagravo a um brasileiro. E isso não deveria ser omitido no discurso oficial da homenagem solene que, com justiça, o governo deve render-lhe nesta 5ª feira, em Brasília.
Desqualificada pela caneta dos vencedores, a agenda do período pede exumação serena e afirmativa.
Contra isso atuou por décadas o monopólio das comunicações, hoje mais forte do que aquele existente há 49 anos, quando a ditadura impôs silêncio sobre o ciclo Jango.
Escribas da confiança do regime, que fariam carreira como confidentes de seus ‘bruxos –dos quais herdariam fuxicos e versões palacianas de densidade fascicular– cuidaram e cuidam de amesquinhar esse capítulo da luta pelo desenvolvimento brasileiro.
Nada mais sério que um mal passo de um país sob a presidência de um político hesitante e mulherengo.
Esse, o epitáfio dos vencedores a Jango e à geração de brasileiros que lutava por um país soberano e justo nos idos de 60.
Importa-lhes, sobretudo, rebaixar o debate em torno daquilo que interliga passado ao presente do país: a agenda e as instituições de ontem e de hoje.
A mídia, enquanto instituição, foi – é – parte interessada no assalto ao poder que interrompeu um governo democrático, suspendeu as liberdades e garantias individuais, sufocou o debate de reformas estruturais, prendeu, matou, torturou.
Foi conivente com a censura à própria liberdade de expressão.
Foi dela a iniciativa de convocar o medo e a mentira e alimentar o linchamento de reputações.
Agiu, não se sabe ainda com que grau de intimidade, mas é notória a sintonia com que atuou em relação ao Departamento de Estado norte-americano que -disso não resta mais dúvida– coordenava a desestabilização do governo Goulart.
Ontem como hoje, o conjunto foi decisivo para levar a classe média a incorporar um discernimento moralista e golpista à sua visão do processo brasileiro.
E mesmo assim, apenas uma parte dela.
O acervo do Ibope, catalogado pelo Arquivo Edgard Leuenroth, da Unicamp, reúne pesquisas de opinião pública feitas às vésperas do golpe.
Os dados cuidadosamente ocultados naqueles dias assumem incontornável atualidade cotejados com a atuação do aparato midiático nas horas que correm.
Enquetes levadas às ruas entre os dias 20 e 30 de março de 1964, quando a democracia já era tangida ao matadouro pelos que bradavam em sua defesa, mostram que:
a) 69% dos entrevistados avaliavam o governo Jango como ótimo (15%), bom (30%) e regular (24%).
b) Apenas 15% o consideravam ruim ou péssimo, fazendo eco dos jornais.
c) 49,8% cogitavam votar em Jango, caso ele se candidatasse à reeleição, em 1965 (seu mandato expirava em janeiro de 1966); 41,8% rejeitavam essa opção.
d) 59% apoiavam as medidas anunciadas pelo Presidente na famosa sexta-feira, 13 de março (em um comício que reuniu 150 mil pessoas na Central do Brasil –o país tinha então 72 milhões de habitantes, Jango assinaria decretos que expropriavam as terras às margens das rodovias para fins de reforma agrária, bem como nacionalizavam refinarias de petróleo).
As pesquisas sigilosas do Ibope formam o contrapelo estatístico de um jornalismo que ocultou elementos da equação política, convocou, exortou, manipulou, incentivou e apoiou a derrubada violenta do Presidente da República, em 31 de março de 1964.
Em editorial escrito com a tintura do cinismo oportunista, um dos centuriões daquelas jornadas, o diário O Globo, fez recentemente a autocrítica esperta de sua participação no episódio. Escusa-se no pontual, lamenta o apoio explícito, mas justifica a violência institucional, como inevitável diante do quadro caótico e extremado vivido então.
Se havia extremismo em bolsões à esquerda, o fato é que a incerteza social e a rejeição ao governo, como se vê pela pesquisa do Ibope, foram exacerbadas deliberadamente pelo aparato midiático para interditar o debate, desmoralizar lideranças, criminalizar bandeiras e vetar as soluções para os desafios do desenvolvimento.
Graus de semelhança com a engrenagem em movimento no país avultam aos olhos menos distraídos.
E esse é o ponto a reter, que faz da exumação dos restos mortais de Jango uma janela importante para enxergar não apenas o passado.
Em que medida a reordenação de um ciclo de desenvolvimento pode ocorrer dentro da democracia quando esta lhe sonega os meios para o debate e a construção das maiorias e do consentimento requeridos ao passo seguinte da história?
O Brasil dos anos 60 vivia, como agora, o esgotamento de um ciclo e o difícil parto do seguinte.
As reformas de base – a agrária, a urbana, a tributária, a política, a educacional — visavam destravar potencialidades e recursos de um sistema exaurido.
O impulso industrializante de Vargas, dos anos 30 a meados dos anos 50, e o do consumo , fomentado por Juscelino, mostravam claros sinais de esgotamento.
Trincas marmorizavam todo tecido social e produtivo.
À vulnerabilidade externa decorrente da frágil capacidade exportadora, adicionava-se um elemento de gravidade inexistente hoje: a seca do crédito internacional, aplaudida pelos que alardeavam a inconsistência macroeconômica do país, a exemplo dos que agora clamam pelo rebaixamento da nota do Brasil junto às agências de risco.
O déficit público pulsava o desequilíbrio entre as urgências do desenvolvimento e as disponibilidades para financiá-lo.
O PIB anêmico e a inflação de 25% no trimestre pré-golpe completavam a encruzilhada de uma sociedade a requerer um aggiornamento estrutural.
O conjunto tinha como arremate a guerra fria, exacerbada na América Latina pela vitória da revolução cubana, que desde 1959 irradiava uma agenda alternativa à luta pelo desenvolvimento.
O efeito na vida cotidiana era enervante. Como o seria no Chile, nove anos depois; como o é hoje, em certa medida, na Venezuela de Maduro; ou na Argentina de Cristina.
O mercado negro de produtos essenciais testava a paciência dos consumidores.
Óleo, trigo, açúcar, carne faltavam ciclicamente nos grandes centros urbanos.
Fruto, em parte, de uma escassez provocada pela sabotagem empresarial.
As reformas progressistas propostas por Jango estavam longe de caracterizar o alvorecer comunista alardeado diariamente nas manchetes do udenismo midiático.
O que se buscava era superar entraves –e privilégios– de uma máquina econômica entrevada em suas próprias contradições.
Jango pretendia associar a isso um salto de cidadania e justiça social, ampliando o acesso à educação e aos direitos no campo para dar um novo estirão no mercado interno.
Diante do salto ensaiado, e convocada a democracia a discutir o passo seguinte da história brasileira, os centuriões da legalidade optaram pelo golpe.
Deram ao escrutínio popular um atestado de incapacidade para formar os grandes consensos indispensáveis à estabilidade e duração de um ciclo de desenvolvimento.
Jango foi assassinado aí, pela primeira vez.
De forma violenta e em praça pública.
Se o fizeram de novo em dezembro de 1976, cabe agora averiguar de uma vez por todas.
Independente desse segundo diagnóstico, o tema das relações entre mídia e ditadura, mídia e desenvolvimento não pode mais se restringir aos bastidores das comissões da verdade.
Ecoa dos idos de 60 uma lição negligenciada por aqueles que ainda encaram o binômio ‘mídia e regulação’ como barganha de indulgência, junto a um poder que, em última instância, deseja-lhes a mesma sorte de Jango.
Não há revanchismo nessa constatação.
Pauta-a a necessidade de dotar a democracia das salvaguardas de memória, pluralidade e participação social, que a preservem de uma recaída da intolerância, como a de 1964, que subtraiu à sociedade a prerrogativa de decidir o seu próprio destino
Por: Fernando Brito, no site Tijolaço.
Tijolaço do Jolugue: De raposas e raposismos.
Quem possui as raposas que o Governo do Estado mantém circulando pelo
quintal do Palácio do Campo das Princesas, na realidade, precisa mesmo é
tomar conta do galinheiro. Uma delas foi cevada na mais tradicional escola
do raposismo pernambucano. Extremamente astuciosa, já se declarou
convertido ao socialismo, depois de reconhecer que havia conquistado
tudo na vida pública. Ao tempo em que anuncia que está pendurando as
chuteiras, mantém suas bases azeitadas para a eventualidade de mudar de
ideia. Seus movimentos não são de quem está se afastando, mas, ao
contrário, indicam atitudes de quem estaria preparando um bote a
qualquer momento. Pelo menos oficialmente, o governador Eduardo Campos
ainda não bateu o martelo sobre o nome da base aliada que deverá
concorrer à sua sucessão no Campo das Princesas, mas há quem antecipe
que a tal raposa estaria de olho na vice.(Ilustra esse post charge do cartunista Miguel, do Jornal do Commércio)
domingo, 10 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: E os meninos jogados no lixo, senhores?
Numa palestra recente, no Museu do Homem do Nordeste, da Fundação Joaquim Nabuco, o sociólogo francês, Michel Maffesoli, fez uma analogia bastante interessante entre o luxo e o lixo. Lembrava o teórico da sociologia do cotidiano, que a etimologia da palavra "luxo", rotineiramente associada pelo senso-comum à luxúria e ao prazer, na realidade, está associada à luxação, contusão. Como o sistema capitalista amplia - para alguns poucos privilegiados - exponencialmente essas possibilidades de acesso ao luxo, certamente isso vem ampliando o fosso que separa a elite do povo, criando situações de anomias ou disfunções sociais. Com a licença poética permitida pelo sociólogo, poderíamos afirmar que o luxo, na realidade, em certo sentido, é um lixo, sobretudo se considerarmos o fato de que seus beneficiários não dão a mínima para o andar de baixo. Nos últimos anos, o Jornal do Commércio vem produzindo alguns cadernos especiais simplesmente soberbos. Um deles, por exemplo, inspirou uma das pesquisas mais importantes da instituição, "Os Nordestes Emergentes". Vou cometer a indelicadeza de ser injusto com alguns profissionais daquele jornal, simplesmente pelo fato de não poder citar todos as grandes reportagens realizados pelo veículo. Posso citar a pesquisa etnogastronômica do jornalista Bruno Albertim, o caderno sobre o problema da fome na região Nordeste, o caderno sobre a precarização de nossas estradas e, mais recentemente, um caderno que resgata o patrimônio cultural vivo do nosso Estado, com a biografia de nossos artistas em atuação. Esse último tipo de pesquisa normalmente é negligenciado. Existe um trabalho clássico sobre o assunto, o "Reinaldo da Lua", de Sílvia Rodrigues, um levantamento único sobre o assunto, bastante pesquisado porque quem deseja saber quem foi Vitalino, quem foi Mestre Saúba, grandes artistas que se foram do nosso convívio. Em sua matéria de capa no dia de hoje, domingo, o jornal sugere uma hashtag sobre o lixo do Recife. Quando fala em lixo, refere-se à nossa responsabilidade e a do poder público sobre o destino dos resíduos sólidos espalhados pela cidade. Não é que essa questão não seja importante, mas talvez fosse mais interessante propor um debate sobre o destino daquelas crianças que vivem no lixo, como lixo. Assim como ocorre com os resíduos sólidos, penso que as responsabilidades, naquele caso específico, também compete a toda a sociedade pernambucana, traduzidas em instituições como a escola, a família, a Igreja, o Estado. Pediram uma reflexão sobre o assunto, aí vai.
Tijolaço do Jolugue: Hoje é dia de PED no PT
Hoje é dia de PED em todo o Brasil. Militantes devidamente regulares com as obrigações partidárias deverão escolher os novos dirigentes petistas. Em Pernambuco, disputam o comando da agremiação a Deputada Estadual Teresa Leitão, o professor de física, Edmilson Menezes, e o advogado da Fetape, Bruno Ribeiro. A posição em relação ao Governo Eduardo Campos é um divisor de águas na legenda. Há aqueles que defendem a radicalização, que o pau deve comer desde já, e os "sonháticos", aqueles que ainda acreditam num recuo da candidatura do chefe do Executivo Estadual e, quem sabe, uma recomposição com o Planalto. Alguns militantes que defendem essa última posição sequer entregaram seus cargos na Prefeitura da Cidade do Recife. A proposta de uma candidatura própria assim como um possível apoio ao nome do senador petebista, Armando Monteiro, também deve movimentar os debates. Na realidade, são questões pontuais.Há alguns problemas estruturais com a agremiação no Estado. O partido precisa retomar seu vínculo orgânico com os movimentos sociais; ponderar sobre o crescente processo de oligarquização da legenda; combater a tibieza e a dubiedade em suas posições - a relação com o Governo Eduardo Campos é uma delas; dirimir os conflitos internos, mesmo que para isso precise tomar decisões duras; reassumir o leme de seu destino no Estado, não se permitindo continuar na condição de reboque de outras forças políticas no Estado. A lista do "dever de casa" da agremiação é grande. É perfeitamente compreensível o quadro de tensionamento vivido pela legenda. Boa sorte ao partido. Boa sorte a todos os candidatos.
Tijolaço do Jolugue: Lula aconselha Haddad a dialogar mais
Lula aconselha Haddad a dialogar mais
Haddad foi uma grande aposta de Lula em São Paulo. O morubixaba petista, à época, enfrentou a ira da ala paulista da agremiação para impor o seu nome. A princípio, foi um projeto muito bem-sucedido. Novato em eleições, patinando nas primeiras pesquisas de intenções de voto, o quadro foi revertido na reta final, apresentado como um grande trunfo de Luiz Inácio Lula da Silva. Haddad, contingenciado por alguns fatores, vem tomando algumas medidas impopulares, como a aumento expressivo do IPTU. Soma-se a esse fato, a corrupção "institucionalizada" na máquina pública do município, um desgaste para gestores de todas as matizes políticas. Por via das dúvidas ( e das dívidas) Lula resolveu aconselhar o pupilo a abrir o diálogo com a cúpula petista, acertando em conjunto, algumas de suas decisões à frente da Prefeitura. — com Ariadne Morais.
sexta-feira, 8 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: O PT também tem morubixaba
Mesmo um partido com as características orgânicas do Partidos dos Trabalhadores, o que o tornaram um caso singular no sistema partidário brasileiro, não escaparam da "Lei de Ferro da Oligarquia", uma teoria construída pelo sociólogo e economista alemão Robert Michels, onde ele comenta sobre a tendência inevitável à oligarquização das organizações sindicais e partidárias. Na Universidade de São Carlos há uma boa tese de doutorado tratando do assunto, discutindo, exatamente, o caso do PT. No dia de hoje, uma tendência do PT, que concorre às eleições da PED, lançou uma nota acusando alguns grupos de não desejarem a "oxigenação' da agremiação. No calor da decisão de afastar-se do Governo Eduardo Campos, uma ilustre Deputada fez referência ao fato de o partido estar se recuando ao debate, uma característica indelével da agremiação. Se dependesse de algumas tendências internas, o partido marcharia em torno da construção de uma candidatura própria. O processo de expulsão de Oscar Barreto também vem sendo muito criticado, classificado por alguns membros da legenda como um verdadeiro "linchamento", promovido por um tribunal inquisitorial. Como antecipou o Deputado João Paulo, o PT em Pernambuco entrou numa encruzilhada bastante complicada. No dia de ontem, o morubixaba da legenda - o PT também tem morubixaba - Lula, manteve um encontro com o senador Armando Monteiro, do PTB. Uma das possibilidades do PT, com o aval de Lula, é a formalização de uma aliança com o senador petebista. O cenário que se avizinha para 2014, portanto, já traz a marca da cizânia entre seus membros, traduzida em expulsões, traições, acusações de parte a parte. Gostaria muito de saber como o grupo que gravita em torno do governador Eduardo Campos irá se comportar naquelas eleições.
quinta-feira, 7 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: Humanize-se, prefeito!
Embora as imagens daquelas crianças recolhendo material reciclável no
Canal do Arruda tenha chocado muita gente, todos sabem que, mesmo que se
encontre uma solução para aqueles quatros garotos, centenas de outros
estarão nos lixões, mangues e outros
canais do Recife, sempre com o mesmo propósito, ou seja, adotando
procedimentos por vezes desumanos, viabilizar as suas precárias
condições de sobrevivência. Comenta-se que o prefeito teria ficado
bastante chocado com aquelas cenas. Qual a origem dessa indignação do
prefeito? Foi uma preocupação de pai, de cidadão, de gestor de uma
cidade onde se permitem situações como aquelas registradas pelos
fotógrafos e jornalistas do Jornal do Commércio? Num dos nossos
últimos post comentei que o filósofo Denis Rosenfield teria se afastado
do PT gaúcho argumentando que eles, em 12 anos de poder, não havia
encontrado uma solução para duas dúzias de crianças que perambulavam
pelas ruas de Porto Alegre. Certamente, esse não teria sido o único
motivo, mas não deixa de ser interessante a observação do filósofo. Nos
permita, prefeito, mas a sua indignação ou comoção pode ser traduzida,
na realidade, como uma preocupação de natureza eleitoral. Foi exatamente
ali que o senhor iniciou o mutirão de limpeza ao assumir a Prefeitura
do Recife. De lá para cá, portanto, pouca coisa mudou. Outro aspecto
negativo para a gestão é essa foto circulando pelo mundo, o que atrai a
atenção para o problema, num momento em que o seu padrinho político move
montanhas para viabilizar-se como candidato às eleições presidenciais de
2014. Quem dera suas preocupações fossem de outra natureza. Isso é uma
grande vergonha. Faz pouco tempo, três crianças morreram numa das
favelas do Recife, queimadas dentro de um barraco. A mãe saiu para catar
latinhas de cerveja e deixou a maior delas encarregada de preparar o
cuscuz, utilizando álcool, uma vez que pobre não dispõe de quarenta e
cinco reais pra comprar um botijão de gás. Houve um incêndio a as crianças
morreram. Há alguns anos atrás, uma criança de 12 anos, foi morta a
pauladas, por traficantes, na cidade de Camaragibe. A criança não tinha
nome. Era conhecida por "Um real", o valor que cobrava para fazer
programas. Esse caso nunca foi esclarecido, mostrando a falência de instituições como a escola, a igreja, o Estado. Eu poderia estender esses
casos indefinidamente, mas não vou fazê-lo. Não precisa. Em cada beco,
em cada esquina, as pessoas conhecem situações semelhantes. Humanize-se,
prefeito.
Tijolaço do Jolugue: O palco das eleições de 2014 já está montado na Av. Paulista.
São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, como sempre, próximo as
eleições, antecipa articulações políticas que, não raro, vão se refletir
em todo o país. O PT praticamente já
sacramentou o nome do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, para
concorrer ao Governo do Estado pela legenda. O ministro está se
submetendo uma dieta rigorosa para iniciar a maratona. Mais uma vez,
Padilha foi uma escolha pessoal de Lula, preocupado em dotar o partido
de quadros novos, com da defenestração de alguns militantes históricos
da legenda. Depois de eleger Fernando Haddad, um novato em eleições,
Lula parece não ter encontrado muita resistência da cúpula paulista da
legenda. Antes, porém, tomou o cuidado de deixar Aloizio Mercadante
"bem-acomodado" em Brasília, como um dos principais coordenadores da
reeleição de Dilma Rousseff. É difícil prevê se os mesmos partidos que
hoje dão sustentação ao Governo Municipal estarão juntos em 2014,
sobretudo em função dos escândalos recentes de desvios de recursos
públicos, envolvendo um cipoal de legendas. Alckmin, que deve tentar a
reeleição, movimenta-se como pode, sobretudo em função do desgaste
proporcionado pelo enfrentamento das mobilizações de rua. Num dia,
reúne-se com tucanos de bico longo para traçar o destino de José Serra.
No outro, entabula negociações com os neo-socialistas no sentido de
contar com o apoio da legenda ao seu projeto de reeleição. Há quem
afirme que Alckmin é uma peça-chave, apesar da resistência de Marina,
para que os socialistas montem um palanque naquele Estado. Aécio Neves,
por sua vez, procura uma saída para o impasse Serra. Os tucanos de alta
plumagem já teriam traçado seu destino, mas, como na fábula de La
Fontaine, inquietam-se sobre quem vai se dispor a colocar o guizo no
pescoço do gato, um gato arisco, de unhas afiadas e vingativo. Bastante
vingativo. Uma das soluções pensadas é indicar o senador Aloízio Nunes
como candidato a vice. Aloízio Nunes é um dos principais escudeiros de
Serra. O palco já está montado na Avenida Paulista.
Tijolaço do Jolugue: Se o PT optar por uma "depuração" do seus quadros, a sangria será grande.
O PT de Pernambuco já teria iniciado o processo de expulsão de Oscar
Barreto, presidente do Diretório Municipal do Recife e ex-Secretário de
Estado do Governo Eduardo Campos. No
contexto da engenharia institucional da composição dos quadros
dirigentes do partido no Estado, onde estão seus "inquisidores", Oscar
não tem a menor chance de escapar da degola. O processo está sendo muito
bem articulado.
Oscar é acusado de um crime gravíssimo: traição partidária. Teria
deixado de apoiar o nome da legenda nas eleições de 2010, o do senador
Humberto Costa. Uma penca de petistas mantiveram uma posição dúbia
naquelas eleições, o que motivaria, igualmente, a abertura de processo
de expulsão semelhante. Segundo comenta-se, a caça às bruxas deve
continuar, envolvendo militantes de alto coturno, como o ex-prefeito
João da Costa. O quadro é preocupante, sobretudo porque antecede algumas
decisões internas importantes, como a PED, e os rumos que a legenda irá
tomar nas eleições estaduais de 2014. Se o partido optar mesmo por uma
"depuração" dos seus quadros, a sangria será grande.
quarta-feira, 6 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: Atoladas no lixo para sempre.
Vem repercutindo bastante a matéria do Jornal do Commércio, do último domingo, sobre as crianças que retiram material reciclado, literalmente atoladas no lixo, no Canal do Arruda, precisamente na Vila Saramandaia, se estou bem de geografia do Recife. Tive a curiosidade de ler a matéria. As crianças comercializam o material retirados e faturam, num dia bom, cerca cinco reais, que utilizam para compra de biscoito ou entregam à mãe, que os utiliza para outras necessidades. Essa situação se arrasta há anos, passando por prefeitos ligados a grupos políticos mais conservadores, outros progressistas, de esquerda. A lista é longa. Salvo algum engano, este último teria colocado aquelas obras como uma prioridade do seu Governo. Não resolvem o problema porque não há vontade política para isso. Agora, em função da repercussão da matéria na imprensa internacional, segundo se informa, a Prefeitura do Recife teria despachado alguma assistente social para conversar com a família das crianças. Medidas pontuais, com direito a tirar uma foto junto à família do garoto e nada mais. Há um problema estrutural com aquela gente. Boa parte se dedica à coleta de material reciclado. Legalmente, as crianças não poderiam estar trabalhando, muito menos naquelas condições. A família poderia ser "responsabilizada". Nos parâmetros de uma sociedade desigual e injusta como a nossa, esses problemas não seriam resolvidos. Elas fazem parte da paisagem social, embora não me acusem de estar propondo alguma "utopia" de sociedade igualitária. Agora se entende porque o filósofo Denis Rosenfield, ao afastar-se do PT, em Porto Alegre, entre suas razões, alegava que o partido, durante 12 anos de poder, não havia proposto uma solução para o problema de duas dúzias de crianças que perambulavam pelas ruas da cidade. Essas matérias causam algumas comoções, repercutem na imprensa, premia seus autores, mas a vida dessas pessoas permanecem no mesmo diapasão.Volto a repetir, na Segunda-Feira, a classe média tradicional continuou levando seus filhos, em carrões com ar-condicionado, para os colégios tradicionais da Av, Rui Barbosa e a elite, cada vez mais distanciada do povo, sequer teve tempo de dar uma olhadinha na matéria, enebriada com suas lanchas e tomando bons Johnny Walker Blue pelas rotas de Maria Farinha e Coroa do Avião. (5 fotos)
Tijolaço do Jolugue: Michel Maffesoli, um espião francês no Brasil?
No dia de ontem, o sociólogo francês Michel Maffesoli esteve no Museu do Homem do Nordeste, da Fundação Joaquim Nabuco, proferindo uma palestra intitulada: "Pós-modernidade e o retorno das emoções coletivas". Maffesoli elegeu o Brasil como um grande laboratório de suas pesquisas. Há quem afirme que, sem o Brasil, o sociólogo não teria atingido o status intelectual que ostenta dentro e fora da academia, daí a importância desse objeto de estudos para a sua sólida produção acadêmica. Maffesoli se insere dentre da mais conceituada estirpe de brasilianistas franceses. Na sua opinião, a cultura da sociedade brasileira sempre o colocou como um país pós-moderno, que não experimentou a transição das categorias da modernidade. Instigado a pronunciar-se sobre os movimentos de rua sacudiram o país a partir de junho, afirmou se tratava de um "Maio de 1968 pós-moderno". "Coxinhas" "Black Bloc", "Mídia Ninja" "Partido Pirata" e todas as tribos estiveram presentes em sua palestra, como sempre. Numa conferência como a do professor, vários links poderiam ser gerados, como, de fato, pelo pronunciamento da platéia, isso foi verificado. Houve um momento em que o professor, perguntado como se mantém informado sobre o Brasil, disse que mantinha seus "espiões" aqui, que sempre o abastece com informações atualizadas sobre o que estava ocorrendo com o país. Supõe-se que esses "espiões" estejam infiltrados na academia, onde os fundamentos teóricos do sociólogos são replicados através de núcleos de estudos, fundados, por vezes, por ex-orientandos seus. Como diria os cronistas esportivos, o estádio veio a baixo. Há duas razões para o riso. Um deles, naturalmente, diz respeito à onda de espionagem reinante, orquestrada sobretudo pelos EUA, envolvendo, inclusive, autoridades brasileiras, o que vem gerando alguns constrangimentos diplomáticos. Outra razão é que no dia de ontem, uma longa matéria de um jornal do Sudeste aponta a existência de um agente do serviço de espionagem francês em Alcântara, onde ocorreu aquele acidente com a plataforma de lançamento de foguetes, que matou dezenas de cientistas brasileiros que trabalhavam no projeto. Aliás, nossos mais bem-preparados cientistas no assunto. A possibilidade de sabotagem nunca foi totalmente descartada. Maffesoli certamente não lê um das nossas mais comentadas revistas nacionais, mas a polêmica em torno de duas de suas reportagens desta semana, certamente o interessariam no contexto de suas abordagens. Uma delas diz respeito ao "coxinha" que está ganhando rios de dinheiros e estuporando em baladas para a rapaziada bem-nascida, ostentando carrões e champanhes caríssimos, acompanhados de algumas beldades. É luxo só. É lixo só. Se existia algum fundo do poço, a publicação chegou lá. O sociólogo, durante a palestra, informou que teve a curiosidade de investigar a etimologia da palavra "luxo". O senso-comum, de imediato, a associaria à luxúria, ao prazer. Não é bem assim. A origem da palavra está associada à luxação, contusão, portanto, a uma situação disfuncional. Embasado nesse raciocínio ele vai observar a ampliação do fosso que separa a elite do povo, consolidando uma dicotomia que vem produzindo uma série de problemas sociais. Embora a abordagem da revista semanal à qual fizemos alusão parece anunciar às elites que elas precisam tomar cuidado com o cerco da periferia pobre e marginalizada - bem ao estilo de sua linha editorial - o fato é que as atitudes de nossas elites e os "amortecedores sociais" têm sido insuficientes para "viabilizar" esses contingentes sociais, dotando-os de uma educação de boa qualidade para os seus objetivos e padrões, assistência médica, acesso à inclusão produtiva etc. Se medidas não forem adotadas para minimizar esse "fosso", certamente eles vão invadir nossa praia. Está tudo errado. As mobilizações de rua já expuseram isso, mas nada, absolutamente nada, é conduzido ou pensado avaliando concretamente essa situação, na observação do sociólogo, "disfuncional". São projetos de mobilidades pensados para quem tem carro, intervenções habitacionais do tipo "higienistas" - como lembrou um colega de trabalho - isolando os empobrecidos em conjuntos habitacionais longe dos grandes centros urbanos, corroendo suas possibilidades de "afetos sociais" e estratégias de sobrevivência etc. Eu não vou me alongar muito porque, nesses momentos, costumo escrever com o coração. O Brasil precisa de espiões com a agudeza de análise de Maffesoli. Na década de 70/80 brasilianistas americanos que vinham estudar o Brasil foram "taxados" de espiões da CIA. Um dos mais reputados deles, Thomas Skidmore, quando questionado sobre o assunto, costumava afirmar que não havia sido a CIA que o matriculou na disciplina. Havia decidido estudar o Brasil, por que as outras disciplinas oferecidas não dispunham de vagas.( Na foto abaixo, além de Maffesoli, o seu mestre, o antropólogo Gilbert Duran, de quem foi orientando).
terça-feira, 5 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: Quem vai colocar o guizo no pescoço de Serra, pergunta o Tijolaço.
O site Tijolaço vem acompanhado de perto o que está ocorrendo no ninho
tucano. No dia de ontem seus caciques se reuniram para um almoço, cujo
prato principal seria Serra. Não, não se trata do peixe Serra, mas do próprio José Serra. A troika tucana procura
um caminho de informá-lo que o concorrente da legenda ao Palácio do
Planalto é mesmo o senador mineiro, Aécio Neves. Desejam passar a régua
no assunto, evitando maiores desgastes e polêmicas, que só aumentam a
cizânia no reduto tucano, fragilizando-os, mais ainda, em sua tumultuada
caminhada. No almoço, o próprio Aécio Neves, Fernando Henrique Cardozo e
o governador Geraldo Alckmin. Lembrando a fábula de La Fontaine, depois
da orgia gastronômica, os morubixabas fizeram a seguinte pergunta: quem
vai colocar o guizo no pescoço do gato. Como afirma o jornalista
Fernando Brito, um gato brabo, arrisco, de unhas afiadas, capaz de, em
desespero, causar um tremendo estrago. Munição para tanto parece-nos que
ele ainda possui. Aécio e Alckmin teriam motivos para recusar a tarefa.
Restaria ao príncipe essa árdua missão, embora sua ascendência sobre o
companheiro não seja a mesma de outrora. No íntimo, os tucanos sabem que
Serra não perdoa Aécio e isso terá consequências nas eleições de 2014. O
jogo do poder é bruto.
segunda-feira, 4 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: Falta rosto e identidade à oposição.
Bastante lúcido o artigo do cientista político Marcos Coimbra, na carta
Carta Capital desta semana, sobre as eleições de 2014. Entre outras
coisas, Coimbra conclui que falta rosto e identidade à oposição.
Talvez por isso, em outros momentos, o professor chegou à conclusão que
as próximas eleições serão favas contadas para os inquilinos do
Planalto. Do lado dos socialistas, há uma briga sobre quem vai liderar a
caça às raposas, se Eduardo Campos ou Marina Silva. Ontem produzimos um
longo post sobre o assunto, enfatizando que, de certa forma, isso vem
contribuindo para desgastar a imagem de Eduardo Campos, quando
confrontada com as contradições internas do seu Governo ou associada à figura de um antigo caçador de marajás. Se o problema fosse
apenas as raposas, até que isso seria resolvido, uma vez que não
heveria necessidade de uma grande logística. Elas estão nos arredores do Palácio do
Campo das Princesas. Mas, de acordo com Coimbra, Marina vem se
comportando como um elefante na sala. Desde que formalizou a
aliança da sua Rede com o PSB, já entrou em rota de colisão com alguns
atores ilustres da legenda, como Amaral, assim como "melou" as
necociações de Campos com os ruralistas de Goiás. E promete mais. Sua
influência é tamanha na aliança que ela conseguiu que o artigo de Amaral, da velha-guarda socialista, fosse retirado do site do partido. Pelo lado do PSDB, as eternas
indisposições entre Aécio e Serra, que se bicam a todo tempo. Embora
fragilizado na máquina partidária, Serra se coloca como postulante. Pelo
seu raciocínio, nada está definido no ninho tucano. "Se Aécio for o
escolhido, eu poderei apoiá-lo". No final, como observa Coimbra, a
oposição não tem nome, não tem identidade, nem um projeto alternativo.
Se há algum tempo o PSDB carrega esse estigma, parece-nos que com o
PSB/Rede também não tem sido diferente. Nesse diapasão, essas eleições
também não devem empolgar muito o eleitorado. Some-se a isso a reação à
crise de representatividade externada nas mobilizações de rua de junho. ( A foto abaixo é de Fernanda Chemale, por ocasião da pesquisa etnográfia para o projeto "Nordestes Emergentes".
domingo, 3 de novembro de 2013
Tijolaço do Jolugue: Pedro Luiz será homenageado pela ALEPE.
O repórter e fotógrafo Pedro Luiz será homenageado pela Assembléia Legislativa do Estado, no próximo dia 07, pelos seus 50 anos de atuação profissional. Nesses cinquenta anos de atuação profissional, Pedro Luiz capturou, pelas suas lentes, diversos flagrantes, alguns raríssimos, como um momento de descontração e lazer do saudoso Dr. Miguel Arraes e Dona Madalena Arraes, quando ambos curtiam uma praia.O outro flagrante abaixo, entre muitos publicados na edição do Jornal do Commércio desse domingo, Pedro Luiz lamenta que nunca tenha sido premiado, mas ele considera um dos seus melhores trabalhos. Parabéns, Pedro.
Tijolaço do Jolugue: Ainda a polêmica do John Walker Blue do PT
Recebi um e-mail abusado de um desencantado petista, alertando-nos sobre a origem social das pessoas que fundaram o Partido dos trabalhadores. De fato, como ele informa, existia trabalhadores e operários, mas existia, igualmente, uma classe média intelectualizada que assinaram a ficha de inscrição do Partido na histórica reunião do Colégio Sion, no dia 10 de Fevereiro de 1980. A gastronomia tornou-se um tema dos mais importantes, sendo possível fazermos algumas ilações a partir do cardápio dos atores políticos. Ninguém pode contestar que, em décadas passadas, o PT tinha a capacidade de dirimir seus conflitos num dos botecos da Rua do Príncipe, depois de um osso de patinho com algumas doses de cachaça. Quando falo que as coisas mudaram bastante depois da introdução do John Walker Blue, também não estou equivocado. Há várias possibilidades de interpretação para a analogia.Ter chegado ao poder, uma delas. Ter sido picado pela mosca azul, outra possibilidade. Ter incorporado o "status quo" de nossas elites, igualmente. É a tal "bacia semântica" à qual fazia referência o antropólogo francês, Gilbert Durand. Tornou-se mais do mesmo. Na década de 80, meu caro, o partido se reunia no Sindicato das Empregadas Domésticas. Hoje eles se reúnem em hotéis cinco estrelas. É o sistema. Agora, que alguns desse petistas sempre conheceram a boa mesa, isso também é verdade. Um forte abraço, um bom domingo.
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