pub-5238575981085443 CONTEXTO POLÍTICO
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terça-feira, 11 de março de 2014



O QUADRO CINZENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL


José Luiz Gomes escreve:
                                   

Ainda repercute bastante pelas redes sociais uma reportagem exibida no último domingo, por um programa de televisão conhecido, sobre o caos instaurado na educação básica brasileira. Pernambuco, Alagoas e Maranhão foram os Estados contemplados na reportagem. Esse quadro não deveria surpreender a ninguém, menos ainda a quem lida diariamente com a cotidianeidade do que ocorre nas salas de aulas das escolas públicas municipais. Neste final de semana, exibimos em nosso blog uma denúncia sobre a qualidade da merenda escolar oferecida aos alunos da Rede Pública Municipal do Recife. Uma gororoba de carne processada, cozinhada ao molho de tomate. Previa-se a oferta de cachorro-quente, mas teria faltado o pão. Só chegaram as salsichas. Deve ser muito complicado encontrar o pãozinho nas padarias do Recife. Um descaso absoluto. Além da escolha por um produto de qualidade duvidosa, soma-se o enorme desrespeito pelo alunado, submetido a esses vexames cotidianos.
                                   O espantoso, no caso, são os valores cobrados pelas empresas vencedoras dessas licitações, além da total negligência dos setores públicos responsáveis e os órgãos de fiscalização que, em tese, deveriam ficar atentos a esses descasos. Se tivéssemos a oportunidade de enumerar todos os "gargalos" da educação básica no país nesse artigo, talvez devêssemos escrever um rosário sem fim, desnecessário para a maioria de nossos leitores. São escolas sem professores, sem bancas, sem banheiros, sem material escolar, de difícil acesso etc. Preferimos nos concentrar nas possíveis causas do problema, ou seja, o que anda errado com o gerenciamento da educação básica no país.
                                   O professor Cristóvam Buarque costuma afirmar que a "municipalização" de nossas criancinhas teriam sido um grave equívoco, daí sugerir que elas voltem a ser “federalizadas”, no bojo de um elenco de medidas – que passa pela melhoria das condições de trabalho do professor - o que poderiam contribuir enormemente para a solução do problema. O Estado, na realidade, entregou nossos entes mais vulneráveis à sorte de prefeituras falidas, prefeitos corruptos, somados a um conjunto de outros fatores que apenas depõem contra a qualidade do ensino básico.
                                   Isso é um fato, sobretudo se considerarmos os níveis de desvios de recursos públicos no Brasil. O FUNDEB, por exemplo, é a rubrica mais visada pelos malandros do erário. Rubrica campeã nos desvios de recursos. No último ano, por exemplo, ocorreu um caso curioso. Os aumentos de repasses de recursos coincidiram com a redução dos índices obtidos no IDEB. Em qualquer análise que se faça, fica evidenciado que existe o problema da corrupção, mas, per si, recursos não é o único problema.
                                   O mesmo raciocínio se aplica aos salários dos professores. A reivindicação por melhorias salariais é justa, mas essa variável nunca esteve diretamente relacionada à melhoria da qualidade do ensino, salvo acompanhada de outras medidas igualmente importantes. Inúmeras pesquisas informam que a qualificação dos professores é uma variável bastante interveniente quando se está em jogo a melhoria dos padrões de qualidade do ensino básico.
                                   Neste caso, há de se perguntar como estão saindo nossos professores dos centros de formação e das faculdades de pedagogia. Aqui vamos entrar numa seara do domínio técnico das habilidades inerentes requeridas para o exercício profissional e a tão polêmica capacidade de formar "alunos críticos", um termo relativamente desgastado nos últimos anos. Já vi gente defender com unhas e dentes essas duas teses, não necessariamente, excludentes.
                                   A tese do domínio das habilidades técnicas sempre esteve mais próxima de teóricos mais conservadores, ao passo que a formação de alunos capazes de compreender a realidade subjacente às engrenagens sociais angariou a simpatia, digamos assim, de certa esquerda. Num ponto, acreditamos que todos concordam: a formação obtida nos centros acadêmicos pode melhorar sim. A Era Lula/Dilma facultou as condições políticas para esse debate. Até bem pouco tempo, em razão dos altos índices de presidiários analfabetos ou com uma precária formação, estava se pensando em oferecer nos cursos de pedagogia uma especialização com objetivo de formar pessoas aptas a atuarem naqueles espaços, numa clara demonstração da sensibilidade social petista na administração pública.
                                   Há quem informe que os cursos de pedagogia, hoje, possuem uma carga horária muito teórica. Nossa experiência com professores desses cursos indicam que faz sentido essa observação. Por vezes os nossos alunos se queixavam de colegas que eram capazes de tecer um rosário de críticas sobre determinadas teorias e incapazes de propor algo diferente ou, concretamente, dizer "como ensinar" determinado assunto ou disciplina.
                                   Outra questão estratégia, lembrada por um colega numa rede social, é a capacidade de mobilização da sociedade civil organizada no sentido de reivindicar, das diversas instâncias de Governo, as responsabilidades necessárias no que concerne ao compromisso de revertermos esse quadro. Até 2020 o país precisa ter índices de países  desenvolvidos, do grupo da OCDE, ou seja um IDEB de 6,0. As recentes mobilizações de rua no país parecem indicar para uma inversão de prioridades das políticas públicas, o que é um bom indicador. O povo deseja uma educação padrão FIFA, uma saúde padrão FIFA. Pena que os governantes continuem ignorando esses apelos legítimos da população.
                                   Como candidatos, sem ter feito a lição de casa – com índices acachapantes no quesito educação – há um deles que anda alardeando sua sintonia com a “agenda das ruas”, um discurso esquizofrênico, que beira ao mau caráter e um profundo cinismo. Para se ter uma ideia, sua Polícia Militar baixou a lenha nos manifestantes em várias ocasiões. A educação no Estado anda mal das pernas. Político cevado no mais puro patrimonialismo da sociedade brasileira, tenta vender a imagem do “novo”, do não político, do diferente, bem semelhante àqueles políticos daquilo roxo que surgem a cada vinte anos. Tollat qui non noverit.
                                   Outro indicador que nos preocupam são os índices alcançados pelos alunos brasileiros no PISA (Programme for International Student Assessment) que, no Brasil, é coordenador pelo INEP. Ao longo dos últimos testes, obtivemos algumas melhorias, mas continuamos na rabeira. NO último indicador, entre 65 países avaliados, ficamos na posição 57%.
                                   A municipalização da educação básica no Brasil surgiu no Governo de Fernando Henrique Cardoso, no bojo dos reflexos das políticas de corte neoliberais na educação, notadamente como “recomendação” dos organismos financiadores internacionais, a exemplo do BID. Esse assunto deu muita tinta para os acadêmicos. Há uma enormidade de estudos sobre o assunto, seja de intelectuais mais conservadores, seja de uma estirpe de bons intelectuais de esquerda, que se preocuparam em produzir bons ensaios críticos sobre o assunto.
                                   Quando ainda estávamos na lida da sala de aula, gostávamos muito de um texto que desconstruía, uma a uma, todas as teses levantadas sobre os possíveis benefícios da municipalização da educação básica. Um bom texto, escrito por uma professora que, infelizmente, não nos recordamos do nome. Entre as possíveis falácias, a professora enfatiza a defesa do princípio – muito ao gosto do mercado – de que a descentralização – e consequente municipalização – permitiria que houvesse um maior controle, uma maior participação e fiscalização da população sobre o que ocorria em sala de aula, cobrando diretamente dos gestores melhores indicadores de desempenho. Por esse raciocínio, a comunidade poderia se dirigir diretamente às autoridades municipais sobre alguma irregularidade observada no município.
                                   É como se a diminuição das “distâncias” proporcionasse uma maior cidadania e, portanto, maior fiscalização e controle que, em última análise, representariam uma melhoria na qualidade do ensino. Nada disso ocorreu. Participação não se impõe por decreto, muito menos ainda podem brotar da prancheta de algum burocrata. Na história desse país a única vez que a população saiu às ruas com uma agenda sobre educação foi nas manifestações de junho de 2013. Há indícios que nos indicam que a rapaziada deve voltar às ruas nos próximos meses. Esperamos que a bandeira de uma educação pública de qualidade esteja entre as suas reivindicações aos governantes de turno, seja ele quem for.

José Luiz Gomes da Silva é editor do blog.



                                    

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