Objetivamente - antes que os bolsonaristas mais radicais também nos trucidem - o Ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, tem, sim, a obrigação de atender, na condição de convidado ou convocado, às convocações emitidas pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados. Como ja ocorrera em outras ocasiões, se o ambiente político não estivesse tão turvo, possivelmente, o senhor Flávio Dino já teria atendido ao pedido do presidente do camissão, que atende aos requerimento de diversos parlamentares.
Ocorre, porém, que o nosso ambiente político deixou de ser civilizado já faz algum tempo. Não vamos aqui entrar nos argumentos apresentados pelo ministro para não comparecer às sessões da aludida comissão. Os bolsonaristas que a integram já estão demasiadamente sensíveis, com os nervos à flor da pela. Não há debate, tampouco argumentos que os demovam de suas ideias fixas. Quem já estabeceu alguma discussão com bolsonaristas radicais deve saber do que estamos falando. Eles primam pela "imposição" de suas convicções aos adversários. Aliás, não existem adversários para os bolsonaristas radicais. São inimigos a serem destruídos.
Desde 2013, talvez um pouco antes, que alguns grupos políticos e sociais, identificados com o ideário da extrema-direita, se mobilizam no país para a construção de Estado autoritário, de perfil protofascista, ultraliberal, produzindo um aparelhamento da máquina e uma crise institucional de proporções alarmantes entre os Três Poderes da República. Um bom exemplo do aparelhamento da máquina pública é o recente escandâlo envolvendo integrantes da ABIN. O clima de indisposições entre os Três Poderes da República talvez seja uma das faces mais visíveis dessa crise institucional produzida pelo bolsonarismo, que objetivava fortalecer o Executivo e esmagar o Judiciário.
Num ambiente político com tais características, não estranha a ira de deputados oposicionistas - alguns deles abrigados na comissão - em relação ao Ministro Flávio Dino. Nos arriscamos a afirmar que, hoje, Flávio Dino talvez seja o ministro mais odiado do Governo Lula por parte da oposição. A razão é simples, Flávio Dino encarna, neste momento, a recomposição do tecido democrático do país, a restituição do Estado Democrático de Direito e, principalmebnte, o "revogaço" que desagrada bastante a oposição, principalmente no que concerne às eventuais regulações das redes sociais e na licenciosidade na concessão de porte de armas. Questões caras ao bolsonarismo, como se sabe.
Não há fantasia ou exagero em afirmar que superamos uma tentativa velada de golpe de Estado e estamos reconstruindo o tecido democrático lesado pelo bolsonarismo. O ministro Flávio Dino, por sua vez, enfrenta, neste momento, aquilo que se convenciou chamar de tempestade perfeita ou maré braba, em bom nordestinês. Não há mais dúvida de que estamos diante de uma crise de segurança pública, de maneira mais efetiva, atingindo entes federados como o Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Alagoas, a terra dos marechais, do grande Graciliano Ramos.
Alagoas ainda não aparece no radar da violência a nível nacional, mas é por pouco tempo. O ministro Flávio Dino acumula convocações não atendidas, o que abre o flanco para as medidas que poderão vir a ser tomadas pelo Legislativo contra o Executivo. Se dependesse da vontade de alguns parlamentares, o ministro atenderia à convocação até sob vara verde, ou seja, receberia a visita da Polícia do Legislativo em seu gabinete. Em tais circunstâncias políticas tão adversas, a possibilidade de salvá-lo da fogueira, indicando-o para o STF, torna-se complicada, uma vez que ele precisa da aprovação do Senado Federal, o que significa que a oposição moveria moinhos para barrar a sua indicação.
O mais complicado é sabermos que não existe o desejo de baixar as armas por aqui. Não foi sem motivo que o ministro afirmou temer até por sua integridade física. Dez meses de Governo Lula depois percebe-se, nitidamente, o que está em jogo: uma política de desgaste sistemático do Governo pela Oposição. Até recentemente, o Ministro Luís Roberto Barroso, Presidente do Supremo Tribunal Federal, afirmou que o ambiente havia sido pacificado. Isso talvez se aplique a algumas questões pontuais. Num plano macro, a Oposição não dará trégua antes de ver o Governo Lula sangrar em praça pública. Os leitores podem nos cobrar depois.
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