Ricardo Brito, Ricardo Della Coletta e Débora Álvares - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Na primeira reação ao Supremo Tribunal
Federal (STF) desde que reassumiu o comando do Poder Legislativo, no
início de fevereiro, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros
(PMDB-AL), anunciou ontem que recorrerá da decisão liminar da Corte que
congelou a tramitação do projeto que inibe a criação de partidos
políticos.
Mesmo negando que haja uma crise entre os Poderes, Renan Calheiros
classificou de "invasão" a liminar dada pelo ministro Gilmar Mendes e
cobrou que o Judiciário faça uma "revisão dos seus excessos". A reação
de Renan foi articulada depois de um encontro com presidente da Câmara,
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
"O papel do Legislativo é zelar por sua competência. Da mesma forma
que nunca influenciamos no Judiciário, não aceitamos que o Judiciário
faça o mesmo", disse o senador, ignorando o fato de que no mesmo dia em
que Gilmar Mendes concedeu a liminar sustando uma votação no Senado a
Câmara aprovou, na Comissão
de Constituição e Justiça (CCJ), projeto que dá ao Parlamento o poder
de rever decisões do STF sobre ações de inconstitucionalidade e súmulas
vinculantes.
"Consideramos isso (a decisão do Supremo) uma invasão e vamos entrar com um agravo regimental
que é, sobretudo, para dar uma oportunidade de o Supremo fazer uma
revisão dos seus excessos", afirmou Renan no final da tarde, após uma
série de reuniões a portas fechadas com aliados no Congresso.
Renan passou o dia discutindo a melhor estratégia para combater a
decisão do Supremo. O advogado-geral do Senado, Alberto Cascais,
encarregado de preparar o agravo, afirmou não ter visto anteriormente
"intervenção tão bravosa" do Judiciário no Legislativo. "É inédito",
disse.
Na prática, o agravo regimental tentará reverter no plenário do
Supremo a liminar de Mendes favorável ao pedido do líder do PSB no
Senado, Rodrigo Rollemberg (DF). Ao sustar na noite anterior o andamento
do projeto que restringe acesso ao tempo de TV e à maior fatia do fundo
partidário aos novos partidos, Mendes disse que a proposta foi aprovada
na Câmara com "extrema velocidade de tramitação", o que poderia violar
os princípios democráticos como o pluripartidarismo e a liberdade de
criação de legendas.
Questionado ontem sobre o despacho da véspera, Gilmar Mendes reagiu:
"Vocês leram o meu despacho. Acham que foi uma tramitação tranquila e
não casuística?", indagou. O ministro Ricardo Lewandowski disse que em
tese é possível interromper a tramitação de uma proposta que tende a
desrespeitar cláusulas pétreas da Constituição. Para Dias Toffoli, o
debate faz parte da "normalidade democrática". "Quem quiser ver crise
quer criar, porque crise não há."
Pró-Dilma. A proposta, cuja votação foi concluída na Câmara e aguarda
votação no Senado, prejudicaria eventuais candidaturas presidenciais de
adversários em 2014 da presidente Dilma Rousseff, como a ex-senadora
Marina Silva, que tenta viabilizar seu partido, o Rede Sustentabilidade,
e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), que negocia aliança
com o Mobilização Democrática (MD), fruto de uma fusão do PPS com o
PMN.
A despeito da ação de Renan, parlamentares de vários partidos saíram
em defesa da decisão do Supremo. O líder do PSDB no Senado, Aloysio
Nunes Ferreira (SP), disse que a Casa "acabou pagando um mico" ao
tentar, sem sucesso, aprovar um pedido do vice-líder do governo, Gim
Argello (DF), para acelerar a tramitação do texto. "Quis adiantar a
tramitação correta e acabou recebendo uma reprimenda do Supremo",
afirmou. "Não adianta dizerem que a decisão do ministro Gilmar é uma
intromissão no Legislativo. Existe juiz no Brasil. O Legislativo pode
nos limites da Constituição, mas não pode tudo quando viola a mesma",
disse o senador Pedro Taques (PDT-MT).
Rodrigo Rollemberg defendeu que o Congresso tenha "bom senso" para
arquivar o andamento do projeto após a decisão do Supremo. "O STF é o
guardião maior da Constituição. O projeto é claramente
inconstitucional." Mas o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves
(PMDB-RN), classificou a iniciativa do líder socialista de "equivocada".
Petistas unidos. O PT, que tem pressa para aprovar a proposta,
questionou o STF. "Quem define a pauta do Senado é o Senado", disse o
deputado Cândido Vaccarezza (SP). "O STF tem que cuidar da vida dele no
Judiciário e a gente cuidar da nossa no Legislativo. Tem que ter uma
hora de aparar as arestas. Nem eu tenho que atuar no Judiciário, nem o
Judiciário tem que fazer lei", afirmou o senador Walter Pinheiro
(PT-BA). / COLABOROU EDUARDO BRESCIANI
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